Gosto de
livros com histórias sobre animais, fictícias ou reais, daquelas que envolvem a gente, tocam fundo
em nossa alma e nos fazem ver os bichos sob um ótica mais humana. Mas confesso
que me entristeço sempre quando a narrativa traz os sofrimentos pelos quais
esses bichinhos passam. Nessas horas, é difícil continuar a leitura. Seja como
for, não me furto de, vez por outra, me aventurar nessas histórias.
Foi assim
que dois livros chegaram às minhas mãos nas últimas semanas, trazendo
lembranças, lágrimas, alívio e encantamento: Caos, o cachorro e Um dia, um
cão. Duas histórias escritas e desenhadas por mulheres. Duas preciosidades.
Caos, o cachorro é uma aventura infanto-juvenil,
escrita por Tathyana Viana, publicada neste ano pelo selo Alfaguara, da Editora
Objetiva. As ilustrações são de Mariana Massarani, designer que já recebeu
vários prêmios, entre eles quatro Jabuti de Ilustração.
O livro de
Tathyana conta a história de um vira-lata que, logo nas primeiras páginas, é
deixado na rua em uma noite chuvosa e fria ainda filhote. Seu abandono chama a
atenção de algumas pessoas que por ali passam, mas ninguém se dispõe a levá-lo
para casa, limitando-se a arrumar comida, água, caixa para dormir e deixando-o
na porta de um pet-shop. Começa aí a
saga do cãozinho.
Cada
capítulo é construído com um nome para o cão e seus possíveis donos, com
direito ainda a uma estadia pelas ruas, onde conhece um companheiro, outro cão,
abandonado como ele, mas mais velho e, portanto, mais “escolado”. Juntos,
começam uma bela amizade entre altos e baixos:
Aqui o tempo vira uma coisa maluca:
entre correr e descansar, ter fome e sede, e sentir a liberdade, passaram-se
muitos dias e muito chão. De repente aconteceu: encontrei um igual. Um
vira-lata marrom, tão perdido e sozinho quanto eu. Criamos uma amizade que só
um cão fiel pode entender. Desde a primeira vez que cheiramos o rabo um do
outro soubemos que seríamos amigos para sempre.
Passamos fome, pegamos chuva, vivemos
na correria. Fomos enxotados e compartilhamos comida, pulgas e carrapatos.
A trajetória
do cão segue, com muitas aventuras e desventuras, debatendo-se entre a
liberdade das ruas ou ter um lar, até encontrar sua verdadeira dona e seu lugar
neste mundo.
A história é
lúdica, tocante, comovente. Não pude conter as lágrimas em muitas passagens do
livro. Lembrava-me de um cão que tive, que tinha uma história semelhante, tendo
sido abandonado na rua, mas adulto. Quis a providência que ele parasse na porta
da minha casa e, quando esta se abriu, disparar pelo seu interior, numa
convivência que durou pouco mais de dez anos. A história de Caos só podia mexer
comigo.
Além disso, “conheço”
Tathyana da internet, desde que comecei a escrever o meu blog, e sabia do
projeto do livro. Aguardei com ansiedade a publicação e, tão logo surgiu a
oportunidade, comecei a lê-lo.
Formada em
Produção Editorial, Tathyana mantém um blog – www.tathyviana.com.br, onde coloca suas
“ideias sobre a vida e a escrita”, com direito a “livros, cachorros, bolos e
sonhos”. Ela conta que quando terminou a faculdade, adotou seu primeiro cão,
Ulisses, que inspirou muitas das aventuras do livro. Atualmente tem dois
vira-latas: Clara Joaquina e Fran Chiquinha.
Um dia, um cão
Um dia, um cão
Já Um dia, um cão é de autoria da
ilustradora Gabrielle Vicent, nome artístico de Monique Martim, nascida em
Bruxelas, na Bélgica. Publicado pela Editora 34, o livro é uma verdadeira joia que
prescinde de texto, de palavras, apresentando apenas ilustrações.
A história é
simples, mas nem por isso menos tocante. Um cão, um carro, uma estrada. O
abandono constatado na medida em que o carro se afasta. Esse cão passa a
perambular pela estrada, pelas ruas, pela cidade, pela praia, buscando
encontrar um porto, uma morada, uma companhia.
Com um traço
espetacular, Gabrielle explora todas as dimensões de linha e de tonalidade do grafite,
criando uma atmosfera única, ressaltada pelo branco da página e pela imaginação
do leitor.
Não é à toa que fui abduzida pelo livro quando o vi na Bienal do Livro em São Paulo. As
ilustrações são hipnóticas, tragando nossos sentidos e nos transportando para além
das páginas. Não há como não se emocionar.
Gabrielle
Vincent é uma artista conhecida na Europa, nos Estados Unidos e no Japão pela
série Ernest et Célestine, que narra
a história do convívio entre um urso e uma ratinha. É autora também de A pequena marionete, que recebeu no
Brasil o Prêmio de Melhor Livro de Imagem de 2007, concedido pela Fundação
Nacional do Livro Infantil e Juvenil - FNLIJ.
Duas
leituras rápidas. Duas leituras eternas.
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