terça-feira, 30 de novembro de 2010

Clique para livros

Comprar pela internet é tão fácil. Basta acessar um site de vendas, escolher o produto, preencher um cadastro e com um simples clique comprar, optando por uma forma de pagamento. Aí dificilmente tem volta e, no mais, é só relaxar e esperar receber o objeto do desejo no endereço de entrega. Fácil, prático, rápido, cômodo. E assim vou comprando, principalmente livros. Só neste mês foram dez exemplares (curioso é que o ano passado, neste mesmo dia, fiz um post falando dos livros que comprei. Na época foram seis). É acho que extrapolei minha cota – e meu saldo bancário também. Mas nem todos foram para mim, alguns comprei para presentear, já que novembro é um mês de muitos aniversários na família e entre os amigos.

Os primeiros foram para mim mesma – Frankenstein e Asilo Arkham, ambos quadrinhos. Pois é, vira e mexe eu acabo comprando gibis, não tem jeito. O primeiro faz parte da Coleção HQ Clássicos, da Editora Larousse, que não me saía da cabeça desde que vi na Bienal do Livro deste ano. Além de retratar fielmente a obra de Mary Shelley, o livro apresenta a história em torno da história, ou seja, as circunstâncias e o contexto em que a autora escreveu Frankenstein.

O segundo quadrinho é uma graphic novel desenhada por Dave MacKean e com roteiro de Grant Morrison. Na trama, os internos do Asilo Arkham, entre eles Coringa e demais inimigos do Batman, tomam conta do asilo e exigem a presença do homem morcego, que será torturado física e psicologicamente pelos vilões. Batman é então mostrado em seus pontos mais fracos. Em paralelo é contada a história do fundador do asilo, Dr. Amadeus Arkham, que atormentado pela loucura da mãe dedica-se à psiquiatria, mas vê-se louco após o assassinato da esposa e da filha.

Depois comprei, para presentear a filha de uma amiga, O Livro de Nina para Guardar Pequenas Coisas, do artista plástico Keith Haring e editado lindamente pela Cosac Naif. Trata-se de um livro infantil, personalizado, feito pelo artista para dar a Nina, filha do pintor italiano Francesco Clemente, em seu aniversário de sete anos. Na obra pode-se desenhar, pintar, colar adesivos, colocar folhas, fotos, enfim tudo aquilo que traz lembranças de momentos bons e inesquecíveis a uma criança.

Do mesmo autor, comprei ainda Ah, se a gente não precisasse mais dormir!, que traz comentários de crianças de diversas idades sobre as obras do artista. Organizadas em temas – símbolos, histórias, emoções, trabalho em grupo, imaginação e diversão –, as obras são apresentadas e acrescidas pelos comentários. Este livro resolvi dá-lo a amiga Gil, que aniversariou em novembro, por ela gostar muito de literatura infantil e arte.

Para minha irmã, que também aniversariou em novembro, dei, como já comentado neste blog, Viva Pagu Fotobiografia de Patrícia Galvão, obra que retraça a trajetória de Patrícia Galvão a partir de material iconográfico e documentos. O livro foi editado pela Imprensa Oficial.

Novembro é ainda o mês de aniversário da minha sobrinha e, para ela, dei o livro escrito pelo seu humorista preferido e que também faz às vezes de repórter: Danilo Gentili e seu Como se tornar o pior aluno da escola, editado pela Panda Books. Não sei muito o que dizer deste livro, porque mal o folheei – não sou lá muito fã dele –, mas pelas resenhas que vi na internet o exemplar oferece “23 lições para que o leitor se transforme em um baderneiro de mão-cheia”. Ricamente ilustrado, o livro traz capítulos ensinando “a colar nas provas, chegar atrasado, criar uma doença convincente, colocar apelidos nos colegas, brigar, jogar a culpa no outro, espalhar fofoca e até a não ler livros”. Enfim, nada mais típico de Danilo Gentili.

Como não sou de ferro, comprei mais livros para mim. Entre eles, uma edição de bolso chamada Contos de Fadas – de Perrault, Grimm, Andersen e outros, com apresentação de Ana Maria Machado, da editora Zahar. Acho que dispensa comentários. O outro foi O Futuro do Livro, obra que traz 60 visões (entre elas de Ziraldo, José Mindlin, Muniz Sodré, Milton Hatoum) opiniões, divagações, comentários sobre o tema. Uma joia rara, da Ipsis Gráfica e Editora.

E, por fim, como não poderia deixar de ser, já que neste mês estreou a primeira parte do sétimo e último livro sobre Harry Potter, comprei duas obras sobre o bruxinho mais famoso da literatura: Almanaque de Harry Potter e outros Bruxos e Harry Potter e a Magia do Cinema. O primeiro livro, de autoria de Ana Paula Corradini e Fábio Sgroi, fala tudo sobre o mundo mágico criado por J. K. Rowling, desde personagens e criaturas, passando por Hogwarts até curiosidades sobre bruxos famosos da TV e do cinema e um super quiz com perguntas-teste sobre a saga potteriana.

Harry Potter e a Magia do Cinema, lançado recentemente pela Panini, trata dos filmes da série e foi escrito e diagramado em colaboração com o elenco e a equipe de produção.

Ainda bem que o mês acabou, mas em compensação um outro começou e com ele mais expectativas pela frente, com as festas de final de ano. Será que vou conseguir me conter daqui para frente? Sei lá, só se me tirarem o computador da vista e das mãos, senão vou continuar navegando – e comprando . É simples, rápido e muito barato.

sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Uma coleção encantada

Algumas pessoas, como eu, podem até torcer o nariz para o livro digital, mas a verdade é que, pouco a pouco a tecnologia vem conquistando mais adeptos. Isso não quer dizer que o livro impresso possa acabar, isso não! Acredito que as duas versões possam conviver pacificamente, lado a lado, uma completando a outra naquilo que lhe falta.

O fato é que hoje recebi um e-mail bem instigante – e atraente –, cujo subject convidava a imaginar um livro que tivesse trailer, como de cinema. Reunindo assim duas das minhas maiores paixões – cinema e literatura – não era de se estranhar que meu interesse tivesse sido despertado. Apressei-me a ler e soube de um projeto bacana que se chama Biblioteca Callis de Livros Encantados‏, da Editora Callis.

A coleção, que tem data marcada para estrear – 7 de dezembro –, compõe-se de 40 títulos infantis de autores brasileiros, que foram totalmente reformulados, para adaptarem-se ao perfil digital. As histórias são narradas e acompanhadas de uma trilha sonora criada pelo músico e compositor Kalau, que ajuda a dar movimento às páginas animadas, conforme informa o release da Callis.

A Biblioteca foi idealizada para ser usada por escolas, mediante pagamento de uma assinatura. Dessa forma, ela não será comercializada por livrarias, tendo seu uso restrito em salas de aula, já que cada título virá acompanhado de um plano de atividades para ser seguido pelo professor. Para adquirir a coleção, a escola deverá ter, basicamente, um computador com acesso à internet .

A ideia da Callis é levar os livros para regiões mais distantes do país, como o interior da Paraíba e, até mesmo para escolas brasileiras no Japão.

A coleção de Livros Encantados será lançada no seminário “Letramento Digital na Escola 3.0”, que a editora está organizando em parceria com o Instituto Canal do Livro. Na oportunidade serão realizadas três palestras: “As tendências do uso da tecnologia educacional via web”; “Os professores e o desafio da leitura; o que fazer para que nossos alunos leiam mais e melhor”; e “Letramento digital na sala de aula: um mundo a explorar”. Mais informações acesse
http://www.callis.com.br/portal/noticia.asp?ArtigoID=310

Digital ou impresso, o que importa mesmo é que iniciativas dessa natureza se intensifiquem sempre mais, promovendo e incentivando cada vez mais a leitura, ampliando o seu alcance e formando ainda mais leitores.

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

Pagu, sempre Pagu

Minha irmã é uma pessoa difícil de presentear. Ela tem um gosto bastante peculiar e apurado, por isso, mesmo tomando todos os cuidados e presenteando-a com algo que queira, ainda assim corre-se o risco de errar. Livros, então, nem se fala. Para quem não gosta de ler, é impensável dar-lhe um exemplar de uma obra, seja ficcional ou não. Mas, então, porque é que eu insisto nessa armadilha? Quem sabe se pela insistência ela não acaba gostando, afinal “água mole em pedra dura tanto bate até fura”, já dizia o velho ditado.

Se fosse me pautar pelos últimos livros que lhe dei, e ela “tentou” ler, certamente desistiria. No final do passado arrisquei-me com Comer, Rezar e Amar, de Elizabeth Gilbert, que minha irmã demonstrou interesse em adquirir. Foi um alívio para mim quando ela se prontificou a ler, mas acredito que não tenha passado das 30 páginas iniciais. Desistiu no início do caminho. Por fim, recentemente assistiu ao filme baseado no livro, que tem Julia Roberts no papel principal, e não fez mais menção em continuar.

Outra desventura foi com Moça com Brinco de Pérola, de Tracy Chevalier, que narra uma possível história do famoso quadro do pintor holandês Johannes Vermeer, em que reproduz uma moça de turbante e brinco de pérola. Também por este minha irmã demonstrou interesse e até chegou a ler bem mais da metade do livro, mas acabou também deixando a leitura de lado, e isso já há um bom tempo.

Depois dessas e de outras tentativas, eu não deveria mesmo insistir, mas outra vez cai na tentação e, por ocasião do aniversário dela, na semana passada, dei-lhe o livro Viva Pagu – Fotobiografia de Patrícia Galvão, de Lúcia Maria Teixeira Furlani e Geraldo Galvão Ferraz. O livro retraça a rica trajetória da musa dos modernistas a partir de amplo material iconográfico e muitos documentos inéditos. Uma verdadeira joia.

Foi um investida arriscada, já que o livro tem 348 páginas e formato 26 x 29,5, nada prático para se carregar e manusear. Mas é uma obra que ela sempre estava comentando, desde o lançamento, em maio deste ano, e, depois, minha irmã tem uma predileção por histórias da vida real, em especial por Pagu e, acreditem, já leu um livro sobre ela (Pagu, da escritora Lia Zatz, lançado pela Coleção A Luta de Cada Um). Está certo que é um livro pequeno, fino, com letras fora do padrão, cheio de cores e diagramação diferenciada, mas pelo menos terminou. Levando tudo isso em consideração decidi a dar-lhe o livro. E acho que não me enganei.

Ontem a vi folheando o exemplar em casa, aliás, ela está de férias, então é uma ocasião perfeita para degustar um livro um tanto complicado de se carregar por aí, pelas ruas da cidade. E, depois, é uma obra para ser vista com calma, página por página, sentada confortavelmente no sofá de casa, sem falar no efeito estético que um livro dessa natureza comporta. E, convenhamos, pressa, pelo menos, é uma coisa que minha irmã não tem.

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

O bruxinho na telona

Mal cheguei ao trabalho hoje de manhã e já fui abordada por um colega que me disse:
– Meu filho chegou às 3 da manhã em casa.
Fiquei na expectativa só pensando no que eu tinha a ver com isso.
– Ele saiu de um carro que estava atulhado de gente, nem sei como todo mundo entrou ali dentro.
Continuei sem entender nada. Foi aí que ele falou:
– Ele foi assistir a pré-estreia de Harry Potter e as Relíquias da Morte e eu o esperei para saber do filme.
Pronto. Ouvir aquelas palavras foram como mágica para mim e apressei-me em saber:
– Verdade? E aí, o que ele achou?
– Nossa! Disse que é bem idêntico ao livro. Ele adorou!

Meu Deus, quase pirei. Se já tinha vontade de assistir ao filme, depois do que ele me contou fiquei mais ansiosa ainda. Quanto esperei por isso, contei os dias até, só falava no filme nestes últimos meses. Disse a mim mesma que iria assistir assim que estreasse e depois veria novamente, para prestar mais atenção aos detalhes que por ventura deixasse escapar da primeira vez.

Mas pensei melhor e achei por bem esperar mais uma semana. Um pouco por causa do alvoroço e das filas enormes, depois porque assim prolongo a expectativa e alimento o meu desejo. É mais ou menos como naquele conto de Clarice Lispector, Felicidade Clandestina, em que uma menina queria muito ler um livro, mas não conseguia emprestá-lo, até que quando o teve em mãos, fazia de conta que não o tinha, escondia-o em algum lugar e se espantava ao encontrá-lo novamente para, de alguma forma, prolongar o êxtase pela conquista e o prazer daquela futura leitura.

E mesmo conhecendo a história, pois já li As Relíquias da Morte quando o livro chegou ao Brasil (até comprei em pré-venda) em 2007, a expectativa pelo filme não diminuiu, ao contrário, só cresceu, porque assim poderei visualizar todo o universo potteriano na tela do cinema e unificá-lo com o meu, concebido durante a leitura.

Este livro é o sétimo e último da saga e, transposto para o cinema, foi dividido em duas partes. A primeira estreia agora. A outra só chega em julho de 2011. Esta última aventura é muito engenhosa, muito boa, repleta de detalhes. Harry Potter amadureceu e com eles seus milhares de fãs. Da história infantil e engraçada do primeiro livro (A Pedra Filosofal), que introduziu toda a história do pequeno bruxo, o último carrega um tom mais sombrio e sóbrio, já iniciado com o quarto livro da série, O Cálice de Fogo.

Muitos personagens povoam as páginas de As Relíquias da Morte e grandes surpresas estão reservadas para Harry e sua turminha. Juntos, eles buscam – para destruir – as horcruxes com que Voldemort dividiu sua alma. Uma empreitada dura, repleta de percalços e reviravoltas, mas também uma jornada de persistência, coragem e amizade.

Mas, enquanto não me aventuro pelas salas de cinema, vou me divertindo com as brincadeiras baseadas na série, como este teste –http://testeparavoce.br.msn.com/entretenimento/harrypotter/Start.aspx – que vi no MSN para saber que “personagem você é no mundo potteriano”. O meu resultado? Harry Potter.

terça-feira, 16 de novembro de 2010

O Leitor e o leitor

Vez por outra eu retomo antigas leituras, seja porque alguma coisa na rotina me remete a elas, seja porque elas ainda estão muito vivas na minha mente. E essa retomada é sempre prazerosa, pois a releitura traz novas perspectivas e visões da leitura inicial que, na pressa, pode ter deixado escapar detalhes de grande importância para o desfecho do livro.

Mas não foram estes os motivos que me levaram a reler, pela segunda vez – ao menos boa parte –, Se um Viajante Numa Noite de Inverno, do escritor italiano Ítalo Calvino. É que a blogueira Érika, do Narrativas e Divagações, queria saber a minhas impressões sobre este livro, que ela deseja ler, mas talvez por não ser ainda o momento certo, vem adiando indefinidamente.

Pra falar a verdade, eu planejava falar sobre este livro em um post que trataria de livros sobre livros, ou seja, livros que falam de livros, uma das leituras de que mais gosto, mas claro, abordaria aqueles que li, como Se um viajante. Sim, este mesmo, porque ele também trata do livro no livro, ou melhor, do ser Leitor, e de todas as implicações que esse papel traz em seu interior, não deixando de lado também a figura do escritor.

O Leitor, contudo, ocupa a cena principal, ele é o protagonista da história e você, como leitor, irá acompanhar a odisseia desse Leitor no papel , muitas vezes se confundindo com ele, já que por não ter nome, pode muito bem ser você. E o que quer esse Leitor, assim como você, é tão somente terminar a leitura do livro que começou, uma aventura que se principia no próprio ato de ler, assim:

“Você vai começar o novo romance de Ítalo Calvino, Se um viajante numa noite de inverno. Pare. Concentre-se. Afaste qualquer outro pensamento...”

Calvino detalha a seguir a melhor maneira e o lugar que o Leitor escolhe para ler, como chegou até o livro, o porquê e como o elegeu, onde e como o encontrou, quais foram os obstáculos enfrentados nessa busca, enfim, cada passo do processo que termina quando o Leitor está confortavelmente instalado lendo o livro.

Aí começa a história em si, ou melhor, a história que está nesse livro que o Leitor está lendo. Da leitura vacilante a princípio, o enredo vai ganhando corpo até prender a atenção do Leitor e, justamente quando esse interesse começa a crescer, a leitura é interrompida por um defeito no livro, que repete, nas páginas seguintes o mesmo início. Frustração e desespero se apoderam do Leitor.

A partir daí o Leitor empreende uma caçada sem fim para recuperar o livro que começou com sua história completa, sem interrupções. E, cada vez que se depara com um novo exemplar que lhe chega às mãos, outra história se desenha a sua frente, que nada tem a ver com aquela que ele começou, mas que o apaixona da mesma forma e o faz querer continuar esse novo enredo. Ao final serão dez romances que o Leitor – e você – começam e, por razões diversas, não conseguem terminar

No meio de tudo isso o Leitor encontra uma Leitora, Ludmilla, apaixonada por livros e para quem a leitura é algo sagrado, tanto que ela se recusa a ter contato com autores e até mesmo com editoras, para não correr o risco de transpor a “linha divisória” que separa um personagem do outro e ter sua condição de leitora perdida:

“– Há uma linha que separa, de um lado, os que fazem livros, de outro, os que leem. Quero continuar a fazer parte daqueles que leem, e por isso presto muita atenção para me manter sempre deste lado da linha, Senão, o prazer desinteressado de ler já não existe, ou se transforma em outra coisa, que não é o que quero. É uma fronteira imprecisa, que tende a desaparecer: o mundo daqueles que têm relação profissionais com os livros está cada vez mais povoado, e tende a se identificar com o mundo dos leitores. Evidentemente, os leitores também são cada vez mais numerosos, mas pode-se dizer que o número daqueles que utilizam os livros para produzir outros livros cresce definitivamente mais depressa que o número daqueles que gostam dos livros para ler. Sei que se eu transpuser o limite, mesmo acidentalmente, corro o risco de perder-me nessa maré que sobe; conclusão: recuso-me a pôr, mesmo por alguns minutos, os pés numa editora.”

Se um Viajante Numa Noite de Inverno, o livro de Ítalo Calvino, com seus vários livros dentro desse livro e a interminável saga do Leitor em busca da continuação das suas leituras é uma grande viagem, uma viagem que quanto mais você se envereda por ela, mais fundo você quer chegar. Se ela vai desembocar em algum lugar, só o transpor da última página dirá. Mas asseguro que é uma aventura pela qual vale a pena tentar.

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Na banca de jornal

Eu ando um tanto nostálgica ultimamente. E, até, já comentei aqui da saudade que sinto de ouvir notícias, na frequência AM, do radinho de pilha. Mas outro dia, outra recordação me bateu forte, fazendo lembrar de um antigo hábito que há muito deixei de realizar: ler as manchetes jornalísticas na banca de jornal.

Parece uma coisa tola, sem sentido num mundo em que a internet é a bola da vez. Sim, posso fazer isso acessando os sites dos jornais no computador ou ainda ligando a TV para assistir ao noticiário matinal, mas confesso que não é a mesma coisa. Falta, por exemplo, o calor humano nesses veículos midiáticos. O mesmo calor que você sente quando está olhando uma publicação em uma banca e percebe uma pessoa ao lado fazendo a mesma coisa. Em dado momento é possível até notar suas expressões frente a uma notícia, quando muito sua opinião sobre o assunto em destaque.

Gosto de circular por bancas de jornal desde criança, época em que meu pai levava minha irmã e eu, sempre aos domingos, para comprar revistas, jornais, pequenos livros, gibis nesses pontos de venda. Era uma grande festa, coroada com a leitura prazerosa ao retornar para casa.

Cresci, os interesses foram se diversificando, mas a rotina das bancas de jornais continuou, ampliando-se quase que diariamente, mas dessa vez mais centrada nas manchetes de jornais e nas revistas de informação. No caminho para o trabalho, por exemplo, cada banca encontrada era um novo motivo para eu parar e olhar as publicações, com atenção e interesse redobrados.

Mas o tempo foi passando e percebi, ultimamente, que esse hábito diminuiu, não sei ao certo o porquê, talvez seja a tal da internet, que te oferece um leque grande de possibilidades, com um sem número de atrativos, rápido e eficaz, mas que ao mesmo tempo restringe, limita e tira todo aquele prazer do convívio com outras pessoas, ainda que anônimas e desconhecidas. Esse mundo dinâmico, mediado por aparatos virtuais, acaba por trazer uma visão “borrada” da realidade, porque não testemunhada, porque não compartilhada.

Por tudo isso, acho que estou precisando mesmo retomar velhos hábitos, voltar meus olhos para as bancas de jornal, fazer minhas paradas matinais por esses espaços, explorar as publicações existentes, antigas e novas, prestar mais atenção ao mundo à minha volta. Ah, e também ouvir mais AM no rádio. Porque a informação só é completa quando dividida e, de certa forma, vivenciada.

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

O meu apocalipse

A aula de Português estava animada e produtiva, como acontecia todas as vezes que a disciplina era ensinada, com os alunos fazendo várias intervenções e brincadeiras. A professora, no entanto, mantinha o controle da sala e conseguia monopolizar a atenção de todo mundo. Esta era uma das aulas de que mais gostava, só que não me lembro bem o ano, só sei que estava no 1º grau – hoje equivalente ao Ensino Fundamental – época em que as ideias fervilhavam na minha cabeça.

Ainda com aquela ideia de ser escritora, mas quase mudando para o jornalismo, tive um rápido insight e acabei levando a minha imaginação a criar uma história, ou melhor, a começar uma história, um pequeno conto em que da animada aula, viveríamos um pesadelo imenso ao sair da sala.

Era mais ou menos assim: a aula acontecia naturalmente, com a matéria sendo explicada e a turma recebendo as lições com interesse, haveria espaço para questionamentos e até brincadeiras. Lá fora caía uma tempestade forte, recheada de trovões e relâmpagos, que duraria até o término das aulas. Dado o sinal, todos se apressam em ir embora, mas ao transpor o portão do colégio a turma sente alguma mudança no ar e percebe, aos poucos, que o mundo ao redor já não é o mesmo e que o tempo dera um salto enorme, de forma que toda aquela vida que conhecíamos havia ficado para trás, perdida num passado longínquo. Apenas “nós” ainda éramos os mesmos.

Bom essa era a trama central, mas não cheguei a desenvolver a continuação. Não consegui pensar em mais nada e ir em frente com o texto. Acabava assim a trajetória da “aspirante” a escritora de ficção para dar lugar a jornalista da vida real.

A ideia do meu conto, eu sei, não é tão original assim. Mas qual não foi minha surpresa quando li Blecaute, de Marcelo Rubens Paiva, que lembrava a minha história, mas claro, muito melhor, com mais ação e uma continuação digna de nota. A narrativa é despojada, instigante, imaginativa. É uma leitura de um fôlego só, que não se consegue largar até chegar ao fim.

O enredo se passa em São Paulo, onde dois rapazes e uma garota, de volta de uma expedição que fizeram a uma caverna do Vale do Ribeira, percebem a cidade deserta, ou melhor, com pessoas, mas estas se encontram duras, como que cobertas por uma capa plástica. Cada uma parada conforme a atividade que estivesse executando no momento em que aconteceu essa espécie de “blecaute”, paralisando tudo, para sempre.

Sozinhos em meio a uma São Paulo caótica, os três personagens – Rindu (narrador), Martina e Mário – tentam sobreviver, buscando entender o que aconteceu à cidade e descobrindo que a situação se estendia ainda a outras regiões do estado, do país, do mundo.

A ideia recorrente de apocalipse sempre acompanhou a humanidade, talvez por isso as catástrofes populacionais na ficção não sejam uma novidade. Mas a maneira de contar sim.

No início do livro, Marcelo Rubens Paiva lembra que para escrever Blecaute se inspirou nos episódios da série Além da Imaginação, telessérie americana, que apresentava histórias de ficção científica e terror, em diversas temporadas, nos anos de 1959, 1985 e 2002.

No livro, a personagem Martina, tentando entender a nova realidade, recorda do filme A última esperança da terra, com Charlton Heston no papel principal, cuja história gira em torno de um cientista que, após a devastação da Terra por uma poderosa peste, se dá conta de ser o único sobrevivente vivo.

O filme, por sua vez, foi baseado no romance de ficção científica Eu sou a Lenda, do escritor americano Richard Burton Matheson, que teve ainda outras duas adaptações cinematográficas: O último homem da terra, com Vicent Price, e Eu sou a lenda, com Will Smith.

Blecaute é, sem dúvida, inspirado nessas histórias para lá da imaginação. Entretanto, para escrever o livro, Rubens Paiva teve também outros estímulos, como as músicas de Tom Waits, King Crimson e Duke Ellington. Confessa ter estado ”deprimido por descobrir o tédio e a solidão, apesar dos apelos, o vício acima de tudo, apesar do universo em expansão (ideia recorrente na obra), sentindo amor pela juventude e ódio pela verdade”.

Todos esses sentimentos estão expressos, de uma forma ou de outra, no livro, como na passagem, no início da história:

No princípio, o Céu e a Terra eram fenômenos divinos; e só. Em seguida, a Razão, a Ciência encontrou teorias que os definissem. A luta da humanidade era explicar o inexplicável. Hoje... meu corpo se curvou para a frente, cansado, desiludido. Dane-se! Me lembro de uma música que falava “Tudo, tudo, tudo vai dar certo...” e acho engraçado. Nada deu certo. Já me falaram de uma nova Era. Já me falaram do universo em expansão. Mas nada deu certo. Nada.
Começou há muito tempo. Sei lá, há uma porrada de tempo.

Depois da leitura de Blecaute entendo o porquê de não ter dado prosseguimento à minha história. Acho que tudo o que pudesse imaginar não ficaria tão bom assim. Adoro ficção, mas definitivamente sou uma escritora da vida real.