segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Retrospectiva Literária 2012



Mais um ano que se encerra e, pela segunda vez consecutiva, participo da Retrospectiva Literária, promovida pela Angélica Roz, do blog Pensamento Tangencial ( http://pensamentotangencial.blogspot.com ), uma blogagem coletiva que reúne mais de 100 blogs todo o ano.
 
2012 foi um ano de leituras intensas, profícuas, inesquecíveis, em que superei a média de livros lidos nos últimos anos \o/, com destaque, mais uma vez, à produção nacional. Bom, vamos aos tópicos da retrospectiva:
 
A aventura que me tirou o fôlego:
 
Expedições urbenauta – São Paulo, uma aventura radical, de Eduardo Emílio Fenianos.
 
Em 1999, o jornalista e fotógrafo Fenianos percorreu a cidade de São Paulo durante 120 dias. Assim, desbravou os extremos da metrópole. Uma aventura e tanto, de conhecimento e emoção.
 
O terror que me deixou sem dormir:

Na colônia penal, de Franz Kafka.
 
Trata-se de uma novela que narra a história de um explorador que é convidado a assistir a uma execução em uma colônia penal francesa. É uma história impactante e absurda, com um final aterrorizante.
 
O suspense mais eletrizante:
 
Assassinato no Expresso Oriente, de Agatha Christie.

Não li muita coisa do gênero neste ano, mas o romance da rainha do crime tem sempre lugar de destaque nas leituras de suspense. Foi como voltar ao fim da minha adolescência, quando comecei a ler os livros de Agatha.
 
O romance que me fez suspirar:
 
Bonsai, de Alejandro Zambra.
 
Já com uma boa bagagem literária, o escritor passou a ser mais conhecido no Brasil com este romance, curto, conciso, preciso. Os personagens, Júlio e Emília,apaixonados por literatura, se amam em meio a livros e sofrem os revezes da vida. Lindo!
 
A saga que me conquistou:
 
As correções, de Jonathan Franzen.
 
Ao contrário de Bonsai, o livro de Franzen é um “livraço” de 584 páginas. Mas é tão bom quanto o romance de Zambra. A narrativa trata dos conflitos de geração, religiosos e de costumes da família americana, os Lambert, na última década do século XX. Uma verdadeira saga, lida em dois momentos distintos.
 
O clássico que me marcou:
 
1984, de George Orwell.
 
O livro me marcou tanto que foi uma releitura, agora sob novo olhar, e acho que até mais proveitosa e impactante do que da primeira vez. Trata-se de uma obra-prima que retrata um mundo fictício em seu possível futuro sombrio sob o regime totalitário e repressivo. Indispensável.
 
O livro que me fez refletir:
 
Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago.
 
Sabe aquele livro que você não quer largar, mas ao mesmo tempo não quer terminar? É Ensaio sobre a cegueira, a história de uma comunidade inteira acometida pela cegueira branca, com exceção de uma mulher, a mulher do médico: “a responsabilidade de ter olhos quando outros os perderam”. Ponto de partida para inúmeras reflexões. Saramago é sempre bom.
 
O livro que me fez rir:
 
O guia do mochileiro das galáxias, de Douglas Adams.

Parte de uma saga que inclui ainda mais quatro livros, o Guia tem tiradas rápidas e por vezes geniais. Entretenimento e diversão garantida nessa viagem pelas galáxias com seres humanos e alienígenas.
 
O livro que me fez chorar:
 
As boas mulheres da China, de Xinran.
 
O livro traz histórias de mulheres, de diferentes idades e condições sociais, que foram entrevistadas por Xinran entre 1989 e 1997. A ideia era mostrar e tentar compreender a condição feminina na China moderna. Em uma dessas histórias, uma menina, abusada pelo pai, tinha como animal de estimação uma mosca. Triste, emocionante.
 
O livro de fantasia que me encantou:
 
A invenção de Hugo Cabret, de Brian Selznick.
 
Depois de assistir ao filme, fui ler o livro e, para minha surpresa, a fidelidade à obra era visível. Além da história bem contada, as ilustrações em grafite de Selznick são belíssimas, dando um up a mais à fantasia.
 
O livro que me decepcionou:
 
Os assassinatos da rua Morgue, de Edgar Allan Poe.
 
Faz tempo que queria ler este livro, já tinha lido muitos comentários a respeito, talvez, por isso, a expectativa era grande. Fiquei decepcionada com a história, cuja solução me pareceu pronta demais. Pode ser pelo fato de ser um conto, tudo ficou claro rapidamente, sem o tempo necessário para o mistério que antecede a resolução.
 
O livro que me surpreendeu:
 
Homem lento, de J. M Coetzee.
 
Não que eu duvidasse de Coetzee, afinal, já tinha lido Desonra e amei. Mas como não sabia nada a respeito do livro, fiquei com um pé atrás. Com uma fluidez que lhe é característica, Coetzee me surpreendeu com essa história que, devo confessar, foi difícil sair dela de tanto que me entreguei à sua leitura.
 
A frase que não saiu da minha cabeça:
 
“...se é que há esperança, a esperança está nos proletas”, de 1984.

George Orwell sabia bem o que tinha em mente quando construiu essa frase.

O (a) personagem do ano:
 
Bartleby, de Bartleby, o escriturário, de Herman Melville.
 
Bartleby é um escriturário contratado de um escritório de advocacia, mas depois de alguns dias desempenhando sua função com afinco, começa a refutar suas tarefas com um firme “prefiro não fazer”, ficando cada vez mais apático e sem ação. Estranho e perturbador.
 
O casal perfeito:
 
Blimunda sete-luas e Baltasar sete-sóis.

Personagens de Memorial do convento, de José Saramago, o casal me encantou com sua história de amor e sintonia, bastando apenas uma troca de olhares para que se entendessem. Muito lindo!
 
O (a) autor (a) revelação:
 
Francisco Azevedo, de O arroz de Palma.
 
É uma categoria difícil, porque o autor não é necessariamente uma revelação, já que tem uma longa estrada na literatura, mas para mim foi, pois não o conhecia.  Com a história de família de O arroz de Palma, ele conquistou um lugar de destaque entre os escritores da minha preferência.
 
O melhor livro nacional:
 
Capitães da areia, de Jorge Amado.

No centenário do escritor baiano, esta foi uma leitura mais do que prazerosa. Lido pela primeira vez, o livro me proporcionou encantamento, diversão, emoção, reflexão. Amei a história dos meninos (incluindo aqui uma garota) abandonados e a luta deles pela sobrevivência nas ruas da Bahia.
 
Só quero fazer um parênteses para outro livro nacional que gostei muito: O filho da mãe, de Bernardo Carvalho. A história se passa em Grózni (capital da república separatista), São Petersburgo, Moscou e Vladivostok, e ainda entre Belém do Pará (Brasil) e Suriname. São histórias que se cruzem e que mostram, aos poucos, a figura das mães em tempo de guerra e o destino de seus filhos. Muito bom.
 
O melhor livro infantil:
 
As aventuras de Firmina Dalva e seus amigos, de Érika Freire.
 
Gosto de incluir nas minhas leituras livros infantis, e dos que li este da jornalista Érika Freire, com ilustrações de Nice Lopes me encantou. É um livro que fala sobre amizades, tendo como protagonistas a gatinha Firmina Dalva, o cão Afonso Tadeu e o canário Zezinho. Uma delícia!
 
A melhor HQ:
 
Sábado dos meus amores, de Marcello Quintanillha.
 
Inclui este tópico por conta porque gosto de HQs e sempre procuro incluí-las nas minhas leituras, independente da discussão se quadrinhos são literatura ou não. Esta HQ traz seis histórias, que se misturam entre crônicas e contos.
 
O melhor livro que li em 2012:
 
Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago.
 
O livro que mexeu comigo, que me perturbou, que me fez refletir, que me emocionou, que me encantou, só podia ser esse mesmo.
 
Li em 2012...
 
54 livros, bem mais do que no ano passado.
 
A minha meta literária para 2013 é:
 
Dar continuidade às minhas leituras, independente da quantidade de livros lidos ou não. Incluir mais HQs e poesia, ler os livros que comprei e que estão se acumulando, fazer releituras, porque são necessárias, e prosseguir na participação dos clubes de leitura: Traçando Livros e da Casa das Rosas. Acho que está de bom tamanho.
 
E para não perder o costume, relaciono abaixo os dez livros que mais gostei em 2012, se bem que este ano foi difícil escolher... Então vamos a eles, sem ordem, apenas a relação:
 
Os dez
 
• Ensaio sobre a cegueira, de José Saramago
• Expedições urbenauta, de Eduardo Emílio Fenianos
• O senhor das moscas, de William Golding
• Bonsai, de Alejandro Zambra
• Bartleby, o escriturário, de Herman Melville
• O arroz de Palma, de Francisco Azevedo
• O homem lento, de J. M. Coetzee
• As correções, de Jonathan Franzen
• Capitães da areia, de Jorge Amado
As boas mulheres da China, de Xinran
 
Bônus para
 
• Memorial do convento, de José Saramago
• O filho da mãe, de Bernardo Carvalho
• Travessuras da menina má, de Mario Vargas Llosa
 
E que venham mais leituras em 2013. Feliz Ano Novo a todos!



sexta-feira, 21 de dezembro de 2012

Natal é família!


A todos os meus amigos, seguidores, ou melhor, leitores deste blog, desejo que o espírito natalino permaneça nos seus corações. Um lindo Natal a todos vocês e seus familiares, afinal, Natal é família!

E para comemorar, deixo aqui a canção de Natal dos professores, funcionários e alunos de Hogwarts, o lar e a família de Harry Potter.


Christmas At Hogwarts

Merry Christmas, Merry Christmas, Ring the Hogwarts bell
Merry Christmas, Merry Christmas, Cast a Christmas spell
Have a Wondrous wizard Christmas
Have a Merry Christmas Day
All around the sparkling fire
Have a Merry Christmas Day
Find a broomstick in your stocking, see the magic on display
Join the Owls' joyous flocking on this merry Christmas Day
Ding Dong ! Ding Dong !
Ring the Hogwarts bell
Ding Dong ! Ding Dong !
Cast a Christmas spell.
Ding Dong ! Ding Dong !
Make the Christmas morning bright
Flying Higher Accross the Sky
Light the Christmas Night
Ding Dong ! Ding Dong !
Merry Christmas, Merry Christmas, Ring the Hogwarts bell
Merry Christmas, Merry Christmas, Cast a Christmas
 
Natal em Hogwarts

Feliz natal, feliz natal, os sinos de Hogwarts estão tocando
Feliz natal, feliz natal, lance um feitiço de natal
Tenha um natal bruxo maravilhoso
Tenha um bom dia de natal
Ao redor do fogo cintilante
Tenha um dia de feliz natal
Ache um cabo de vassoura em sua meia-calça, veja a magia à mostra
Junte-se ás corujas nesse lindo dia de Natal
Ding dong, ding dong!
O sino de Hogwarts tocou
Ding dong, ding dong!
Faça um feitiço de natal
Ding dong, ding dong!
Faça sua da manhã de natal brilhante
Voando alto através do céu
Ilumine a noite de natal
Ding dong, ding dong
Feliz natal, feliz natal, o sino de Hogwarts toca
Feliz natal, feliz natal, lance um feitiço de natal

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

1984 - Releituras são necessárias


Quando o Clube de Leitura, um dos quais participo, escolheu para ler 1984, o romance de George Orwell, fiquei aliviada. Afinal, já tinha lido a obra e, embora tenha sido há um bom tempo, ainda lembrava da história, pelo menos o essencial, o que significava que não precisaria interromper minha lista de livros a ler naquele momento.
 
Porém, como nossa última discussão – Homem lento, de J. M. Coetzee, livro que acabara de ler – fora bem proveitosa, sobretudo porque a narrativa estava toda fresca na minha cabeça, achei por bem reler 1984, para relembrar os detalhes e pormenores da obra. Principalmente porque, puxando pela memória, li esse livro há pelo menos 26 anos, sim 25 anos! Se bobear, li pouco depois do ano que dá título a obra. Portanto, mais do que na hora de retomar.
Foi bom reler, pois enxerguei 1984 sob nova ótica, agora mais madura e experiente. O impacto, contudo, me tomou novamente, o que significa que o livro é atual apesar do tempo, das mudanças políticas, sociais e tecnológicas no mundo e do meu próprio conhecimento da obra. Posso afirmar, com certeza, que novas descobertas se fizeram presentes e a leitura se tornou muito mais prazerosa na medida em que me vi refletida na trama.
Escrito em 1948, o livro foi publicado em 1949, pouco antes da morte de Orwell, que estava com tuberculose. Trata-se de um clássico, uma obra prima, que retrata um mundo fictício em seu possível futuro sombrio sob o regime totalitário e repressivo. O autor, que imaginara e sonhara com um tempo de fraternidade, lamentava os caminhos pelos quais o mundo seguia, sobretudo com a era “Stalin”, da então URSS, e, assim, registrou suas impressões nesse distópico romance.
Em 1984 o mundo está dividido em três grandes superestados – Eurásia, Oceania e Lestásia –, que vivem em guerra permanente, sem contudo ter um vencedor. O que importava era mostrar quem detinha o poder. A história se passa na Oceania, potência que engloba os países de todos os oceanos. Uma aglomeração da Alca (Área de Livre Comércio das Américas), Sul do África, o atual continente da Oceania e o Reino Unido.
Comandada pelo Grande Irmão, o Big Brother, o chefe do Partido, que vigia a todos por meio de teletelas instaladas por todo o território, a Oceania reprime as liberdades e controla tudo, inclusive o idioma, com a adoção da Novalíngua, cuja característica principal é a redução de palavras do vocabulário. A ideia é que não conseguindo encontrar a palavra certa para determinada coisa ou conceito, ela não seja mais pensada e, assim, disseminada. Controle a comunicação, a linguagem, que se controlará o povo.
Na Novalíngua, uma das expressões mais reproduzidas é o duplipensamento, ou seja, “a capacidade de abrigar simultaneamente na cabeça duas crenças contraditórias e acreditar em ambas... O processo precisa ser consciente, do contrário, não seria conduzido com a adequada precisão, mas também precisa ser inconsciente, do contrário traria consigo um sentimento de falsidade e, portanto, de culpa...”
Um dos grandes exercícios deliberados de duplipensamento está no nome e na função dos quatro ministérios que governam a Oceania: Ministério da Paz, que cuida dos assuntos de guerra: Ministério da Verdade, que trata das mentiras; Ministério do Amor, que pratica a tortura; e o Ministério da Pujança, que lida com a escassez de alimentos:
... Pois somente reconciliando contradições é possível exercer o poder de modo indefinido. É a única maneira de quebrar o antigo ciclo. Se quisermos evitar para sempre o advento da igualdade entre os homens – se quisermos que os Altos, como os chamamos, mantenham para sempre suas posições –, o estado mental predominante deve ser, forçosamente, o da insanidade controlada.
E tudo isso alinhado ao slogan do Partido: Guerra é Paz; Liberdade é Escravidão; Ignorância é Força.
Nesse mundo, Winston Smith é um desconhecido funcionário do Ministério da Verdade, órgão que cuida da informação pública do governo e da reescrita da história. Embora sob controle, ele começa a tomar consciência da opressão em que a sociedade vive e dá os primeiros passos para sair da passividade. Ao se relacionar com uma colega de trabalho, Júlia, que também se mostra revoltada com o sistema, Smith se arrisca ainda mais e acredita que O´Brien, membro do Partido, também está do lado deles. E aposta suas fichas – e esperanças – nos proletas, a classe “livre” da vigilância, mas dependente também ao Partido, enfim, "pessoas que não tinham aprendido a pensar, mas que acumulavam em seus corações, ventres e músculos a força que um dia subverteria o mundo”.
Para Smith, “se é que há esperança, a esperança está nos proletas."
É um livro para ser lido e relido e re-relido, de tempos em tempos. O impacto pode não ser o mesmo, mas sempre permeará a leitura. Em maior ou menor escala, de forma diversa ou com algumas semelhanças, muitas das impressões de Orwell podem ser vislumbradas na época atual, e com a nossa anuência.
1984 foi traduzido para mais de 65 idiomas e publicado por diversas editoras, entre elas a Companhia das Letras. Ganhou também duas adaptações para o cinema: a primeira em 1956, por Michael Anderson, e outra em 1984, por Michael Radford. E ainda para a TV (BBC) e no formato de ópera, além de inspirar o reality show Big Brother, a HQ V de Vingança, o filme Equilibrium e o jogo de computador Half Life 2.
Indispensável!

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

Pagu


Patrícia Rehder Galvão, a Pagu, foi uma mulher a frente do seu tempo, nos anos de 1920, e se tornou escritora, poeta, diretora de teatro, tradutora, desenhista e jornalista. Militante comunista, foi ainda, a primeira mulher presa no Brasil por motivações políticas.
 
Para lembrar os 50 anos da sua morte, deixo aqui um poema de Raul Bopp, o poeta que lhe deu o apelido de Pagu.
 

COCO
(Raul Bopp)
 
Pagu tem os olhos moles
uns olhos de fazer doer
Bate-coco quando passa
Coração pega a bater
 
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer
 
Passa e me puxa com os olhos
provocantissimamente
Mexe-mexe bamboleia
pra mexer com toda a gente

Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer
 
Toda gente fica olhando
seu corpinho de vai-e-vem
umbilical e molengo
de não-sei-o-que-é-que-tem
 
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer
 
Quero porque te quero
Como não hei de querer?
Querzinho de ficar junto
que é bom de fazer doer
 
Eh Pagu eh!
Dói porque é bom de fazer doer.

segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

Uma barata no caminho - #HoradeClarice

Clarice Lispector ainda é um mistério para mim.
Seus escritos são intensos, mas complicados. Assimilá-los não é uma tarefa nada fácil, mas quando chegamos lá eles se tornam fascinantes, penetram em nossa pele, tocam nossa alma, chocalham nossa vida.
Recentemente me aventurei por A paixão segundo G.H., um livro que desejava ler há tempos e do qual já tinha ouvido falar muito – e sempre com elogios. Além disso, havia feito um teste na internet, indagando “que personagem de Clarice Lispector você é?” ( http://educarparacrescer.abril.com.br/leitura/testes/que-personagem-de-clarice-lispector-e-voce.shtml ) , e não é que deu G.H.? Perfeito (?), por isso mais do que depressa me pus a ler.
Confesso que não foi uma leitura prazerosa, no começo até que fluiu bem, mas depois a narrativa permeou-se de “fluxos de consciência” que, embora interessantes, se o leitor se distrai o mínimo que seja, perde o fio da meada. Se interrompe a leitura, então, ao retomar já não consegue se situar... é preciso voltar algumas páginas para engatar novamente.
Publicado em 1964, o livro trata de uma mulher identificada como G.H. , uma escultora, de classe média alta que vive sozinha. Após demitir sua empregada, ela resolve limpar o apartamento, começando pelo quarto onde a doméstica dormia, já pensando no trabalho que teria pela frente, pois imaginava estar tudo em desordem. Qual não é sua surpresa ao entrar e se deparar com um ambiente claro, arrumado e limpo!
Até aí tudo bem, ela faz alguns questionamentos – e descobertas - a cerca da empregada, sem maiores consequências até que ao abrir a porta do guarda-roupa, que está vazio, se defronta com uma barata. Com medo e repulsa, G.H. esmaga a barata com a porta, mas não o bastante para matá-la, deixando o inseto em lenta agonia. A partir daí tece várias reflexões, sentindo com o ato a perda da própria individualidade. G.H. sente-se sem chão, levando o leitor a uma sensação de angústia e perplexidade e conclamando-o a embarcar também nessa viagem.
O interessante é que a história é narrada pela personagem em capítulos, que começam sempre com a última frase terminada pelo anterior.
G.H. é, sem dúvida, uma personagem misteriosa, que tem tendência ao isolamento, recorre com frequência ao passado, mostra-se forte para as pessoas, mas no fundo é bastante frágil. Uma impostora diante da vida. Seria eu assim, também? Em certa medida acho até que sim, de outra forma a passagem a seguir não teria me surpreendido tanto:
Pela primeira vez eu sentia com sofreguidão infernal a vontade de ter tido filhos que eu nunca tivera: eu queria que se tivesse reproduzido, não em três ou quatro filhos, mas em vinte mil a minha orgânica infernalidade cheia de prazer. Minha sobrevivência futura em filhos é que seria a minha verdadeira atualidade, que é, não apenas eu, mas minha prazerosa espécie a nunca se interromper. Não ter tido filhos me deixava espasmódica como diante de um vício negado.
É, Clarice faz pensar, refletir, questionar... desde, então, é o que estou fazendo. Pensando bem, acho que é esta, afinal, a função da literatura.

sexta-feira, 7 de dezembro de 2012

Leituras antes do fim do mundo

Profecias sobre o fim do mundo acontecem com certa frequência. Religiosos e falsos profetas já proclamaram que o mundo acabaria em 1977, em 1994, no ano 2000, na virada do milênio, enfim, uma infinidade de datas que não se concretizaram, para nosso alívio. Ainda bem!
 
Recentemente, com base no calendário maia, propaga-se que o mundo acabará no próximo 21 de dezembro, portanto daqui a duas semanas para ser mais exata. Será?
Difícil pensar no que fazer nesses próximos dias... o jeito é ir levando a vida normalmente, como se nada fosse acontecer, mesmo porque a gente não sabe o dia de amanhã. Mas não posso deixar de pensar nas minhas leituras e na infindável lista de livros que tenho para ler. Se os prognósticos estiverem certos não haverá tempo para ler tudo o que quero, infelizmente.
Então, já que o tempo é curto é necessário priorizar, e fiquei pensando naqueles livros que leria nesse exíguo período que resta. Não é uma tarefa nada fácil, pois tudo me parece prioritário, mas, por ora só consigo pensar em três títulos que insistem em ocupar a minha mente nesses últimos dias do ano:
1.     Uma morte súbita, de J. K. Rowling
A autora me conquistou de vez com a saga Harry Potter e, agora, ao publicar seu primeiro livro para o público adulto, é natural que eu tenha curiosidade em conferir seu desempenho na nova jornada. Independente de ser bom ou ruim, o importante é lê-lo antes que o mundo acabe para não ficar na dúvida.
O livro conta a história do vilarejo Pagford e seus habitantes. Após a morte inesperada de um membro da Câmara do povoado, Barry Fairbrother, a aldeia fica em choque.
2.     Um erro emocional, de Cristovão Tezza
O autor me impressionou com o tocante O filho eterno, com sua escrita primorosa e, por isso, fiquei ávida por conhecer mais sua obra. Dentre seus livros publicados, interessei-me primeiro em ler Um erro emocional.
O romance narra a história de amor entre uma revisora de textos, Beatriz, e um escritor, Antonio Donetti. Quando eles se conhecem, Donetti declara que cometeu um erro emocional ao se apaixonar por ela e pede que o ajude no novo romance que está escrevendo. Eles poucos falam ou conversam, mas passam e repassam suas vidas nas lembranças de cada um, desenvolvendo uma ligação forte.
3.     Levantado do chão, de José Saramago
Saramago consegue me envolver com suas narrativas orais e histórias em que mistura a ficção com a realidade. De sua vasta obra já li A viagem do elefante, As intermitências da morte, Ensaio sobre a cegueira e Memorial do convento. E, a cada livro, fico mais apaixonada. É difícil escolher uma obra dentre tantas do autor que ainda quero ler, mas Levantado do chão é a que me chama mais atenção no momento.
O romance percorre uma zona do Alentejo caracterizada pelo latifúndio desde o final do século XIX. Saramago narra a luta de um povo em meio às forças opressoras, como os latifundiários, a ordem e a Igreja.
O livro é considerado como um dos romances fundamentais de José Saramago, tendo recebido o Prêmio Cidade de Lisboa, em 1980, e o Prêmio Internacional Ennio Flaiano, em 1992.
E não é só por isso não. Quando da leitura de Memorial do convento, li na orelha do livro, uma referência a Levantado do chão, dizendo ser impossível ler as primeiras linhas deste romance e não se sentir seduzido pela escrita de Saramago. Pronto, bastou para desejar ser este o próximo livro do autor que irei ler.
Feitas minhas justificativas, fica aqui a lista dos três livros para ler antes do fim do mundo. Então, vamos a elas... se correr, acho que dá tempo.
Mas, cá entre, nós. Espero que ainda não, pois tenho muitos outros à minha espera.

quinta-feira, 29 de novembro de 2012

#doeumlivro


Livros são companheiros, são aliados, são mágicos. Mas uma leitura não deve permanecer no leitor, ela precisa ser vivenciada e, mais do que isso, semeada. E a melhor forma de fazer isso é compartilhar, mas não só o seu conteúdo, como também seu objeto físico – o livro propriamente dito.

Por isso, campanhas como a #doeumlivro são sempre bem-vindas. Nascida em 2009 no Twitter (@doeumlivro) a ação logo se materializou pelas ruas, ganhando adesões e parceiros, como a rede de farmácias Droga Raia. Esta disponibilizou suas lojas para que os livros fossem doados, por meio de totens personalizados (foto abaixo à esq.) para ilustrar o ponto de coleta.

E foi exatamente em um desses pontos que deixei meus livrinhos (foto abaixo à dir.), contribuindo assim para a disseminação da cultura.
 
Além da rede, também o bar Mortadela Brasil, no box 4 do mezanino do Mercado Municipal Paulistano de São Paulo está apoiando a ação pelo segundo ano consecutivo. O bar oferece 10% de desconto na conta de quem colabora com a iniciativa doando um ou mais livros.
 
A campanha, que na última edição recebeu 215,5 mil livros, espera arrecadar aproximadamente 250 mil exemplares neste ano. Para tanto, conta também com o apoio da Fundação Abrinq e da Sempre um Papo.

Para quem quiser fazer sua doação, ainda é tempo. A campanha vai até o dia 31 de janeiro de 2013.
 
Mais informações acesse o blog da campanha - http://doeumlivrononatal.blogspot.com

sexta-feira, 23 de novembro de 2012

Vida é sonho... é filme

Borges, Gabriel García Márquez, Mario Vargas Llosa, Isabel Allende, Roberto Bolaño, Ernesto Sabato, Carlos Fuentes e, claro, Machado de Assis, João Guimarães Rosa, Graciliano Ramos, Clarice Lispector, Jorge Amado, entre outros. Para o nosso conhecimento e deleite, suas vastas obras estão ao nosso alcance, bastando somente que nos aventuremos por elas.
 
Existem, porém, outros autores que, por não terem seus livros – ou pouco deles – traduzidos para o português, embora apresentem uma trajetória considerável em seus países de origem, passam despercebidos pelos brasileiros. Foi o caso do chileno Alejandro Zambra, cujo belíssimo Bonsai foi finalmente publicado no Brasil pela Cosac Naify, conquistando leitores.
Depois de conhecer e me encantar com Zambra, minhas atenções voltaram-se para outro autor chileno, que teve uma de suas obras publicada também pela Cosac Naify: Hernán Rivera Letelier, com seu tocante A contadora de filmes, um livro de pouco mais 100 páginas que fala sobre a importância da imaginação e da ficção na vida das pessoas, em especial das crianças.
 
O projeto gráfico é uma atração à parte: magnífico, com trechos impressos em um retângulo claro em meio ao negrume da página, semelhante a uma tela de cinema projetada em uma sala escura. 
Quanto ao enredo, o livro resgata um tempo em que o poder da palavra era suficiente para conhecer uma história, sem precisar vê-la, com os próprios olhos. E vai avançando com a chegada da modernidade e das mudanças no estilo de vida das pessoas, deixando marcas sentidas naqueles que não acompanham as transformações do mundo.
A narrativa é simples em meio a um cenário árido: o povoado salitreiro do deserto do Atacama, região norte do Chile. Ali, no final da década de 1950, vive uma família pobre e apaixonada por cinema, que aos domingos vai à única sala existente no local. Quando o patriarca sofre um acidente e fica impossibilitado de trabalhar, a situação financeira deles é bastante afetada. A mãe não aguenta a situação, vai embora, deixando marido e cinco filhos.
Para aliviar as mazelas, o cinema é a válvula de escape necessária, mas com a renda reduzida, só um dos integrantes da família poderá assistir aos filmes, tendo a incumbência de, na volta, contar aos demais a história. Nessa tarefa, é a filha mais nova, Maria Margarita, a narradora e protagonista do livro, quem se sai melhor:
Cheguei em casa com os olhos vermelhos. Todos me esperavam com grande expectativa. Tomei em silêncio a xícara de chá, me pus na frente deles, e sem que meus joelhos tremessem nem nada, comecei a minha narração.
Foi então que alguma coisa se apoderou de mim.
Enquanto contava o filme – gesticulando, dando braçadas, mudando a voz – ia como que me desdobrando, transformando, convertendo-me em cada um dos personagens. Naquela tarde fui Ben-Hur, o jovenzinho. Fui Messala, o malvado do filme. Fui as duas mulheres leprosas que Jesus curou.
Fui o mesmíssimo Jesus.
Eu não estava contando o filme, eu estava atuando o filme. Mais ainda: eu estava vivendo o filme.
Meu pai e meus irmãos me ouviam e olhavam para mim de boca aberta.
 
Com boa memória, criatividade e desenvoltura, Maria Margarita torna-se assim “a contadora de filmes” oficial da família e, mais tarde, do povoado, adotando até um novo nome – Fada Docine:
Sem ter pensado nisso, para eles eu tinha me transformado numa fazedora de ilusões. Numa espécie de fada, como dizia a vizinha. Minhas narrações de filmes os tiravam daquele amargo nada que era o deserto, e mesmo que fosse por um instante os transportava a mundos maravilhosos, cheios de amores, sonhos e aventuras. Em vez de vê-los projetados numa tela, em minhas narrações cada um podia imaginar esses mundos ao seu bel prazer.
Porém, à medida que o tempo avança, novos costumes se fazem presentes, a família se transforma, membros partem, outros ficam e tem pouca sorte. Em meio a tudo isso, Maria Margarita não se queixa, não esmorece; aceita sua sina, prossegue com seus sonhos, sempre, até o fim. Talvez porque a vida é um sonho e o sonho é um filme:
Uma vez li uma frase – com certeza de algum autor famoso – que dizia algo assim como a vida está feita da mesma matéria dos sonhos. Eu digo que a vida pode perfeitamente estar feita da mesma matéria dos filmes.
Contar um filme é como contar um sonho.
Contar a vida é como contar um sonho ou contar um filme.
Sobre Letelier vale destacar que ele é natural de Algorta e já publicou mais de dez livros. Este, A contadora de filmes, está sendo adaptado para o cinema pelas mãos do cineasta brasileiro Walter Salles. É aguardar pra ver, enquanto isso, leia o livro.