terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Quando a mente adoece

A mente humana é uma fonte prodigiosa de atividades psíquicas e intelectuais, cuja capacidade extrapola os limites que a própria pessoa lhe impõe. Isso porque, muitas vezes, não usamos todo o nosso potencial, a menos que fatores externos nos estimule ou nos obrigue a isso. Mas, da mesma forma que ela cria coisas extraordinárias, conduzindo-nos para uma vida plena e saudável, também pode tender a disfunções, enveredando-nos pelos vários caminhos da depressão e das doenças da mente.

Eu mesma já passei por períodos assim, depressivos, um deles recentemente, sem maiores consequências. Mas posso dizer que, por mais que você tente manter sua mente em controle, ela dá um jeito de se rebelar, de escapulir para outros lados, como se tivesse vida própria. Tentar sair de crises assim, sozinha, é impossível, mas o pior é o preconceito que estados dessa natureza carregam. Somente quem passou ou passa por algo semelhante é capaz de entender todo o alcance dos estados doentios da mente. Por felicidade, há soluções, tratamentos e, na maior parte da vezes, remédios quer queiram ou não.

Ao ler Uma Mente Inquieta, de Kay Redfield Jamison, autoridade internacional em doença maníaco-depressiva e uma das poucas mulheres catedráticas de medicina em universidades norte-americanas, é impossível não se deixar tocar pela narrativa e, ao mesmo tempo, procurar conhecer mais sobre as doenças que podem manifestar-se em uma mente humana.

O livro é um testemunho pessoal da pesquisadora, ela própria acometida pela doença maníaco-depressiva. A obra é a revelação da sua própria luta, desde a adolescência (a primeira manifestação que teve foi aos 17 anos) com a doença, e de como esta moldou sua vida. Já no início, Kay dá uma pequena mostra do estado eletrizante que vivia – e vive, caso não controle – a sua mente:

Quando são duas da manhã e se está maníaco, mesmo o centro médico da UCLA tem um certo atrativo. O hospital – geralmente um aglomerado frio de prédios desinteressantes – tornou-se para mim, naquela madrugada de outono há quase vinte anos, um foco do meu sistema nervoso perfeitamente sintonizado, em intenso estado de alerta. Com as vibrissas ardendo, as antenas empinadas, os olhos se adiantando velozes, facetados como os de uma mosca, eu absorvia tudo ao meu redor. Eu estava correndo. Não simplesmente correndo, mas correndo com velocidade e fúria, como um relâmpago a atravessar, de um lado para o outro, o estacionamento do hospital, procurando gastar uma energia ilimitada, irrequieta, maníaca. Eu corria rápido, mas lentamente enlouquecia.

A princípio, suas crises lhe traziam uma enorme carga de energia, que a fazia produzir, criar, pesquisar, trabalhar incansavelmente, brilhantemente. Porém, com o decorrer do tempo, essas fases eram seguidas de estados depressivos, em que tudo era obscuro, vazio, sem sentido. Nesse mesclar de sentimentos adversos ela foi levando a vida, conseguindo estudar, se formar, dar aulas e manter-se no trabalho clínico que, por ironia, era justamente atender pacientes com a mesma doença. Fico imaginando se esses pacientes, ou seus familiares, tinham consciência do problema, ou, então, se tivessem, se ainda assim continuariam o tratamento com ela.

De qualquer forma, Kay aproveitou sua doença para aprender mais, se especializando no assunto, procurando ajudar os outros e a si mesma. No entanto, ela tinha uma certa resistência em utilizar um medicamento que começava a se mostrar eficaz nos distúrbios bipolares: o lítio, por causa dos efeitos colaterais que desencadeava. E, assim, no decorrer do tempo, as alternâncias de seu estado emocional foram se intensificando, de forma que nem pensar ou ler ela conseguia mais, sua mente era muito rápida, muito dinâmica, sem concentração e acompanhá-la tornou-se uma tarefa complicada, até mesmo para ela. Além disso, a fase depressiva era cada vez mais terrível e mortal, ao ponto de ela quase ter conseguido se matar.

Felizmente ela rendeu-se ao tratamento, deixando bem claro que a associação entre medicação – no caso o lítio –, a psicoterapia e o amor da família e amigos são fundamentais para controlar a doença.

Concordo em gênero, número e grau com a visão de Eliot, ecoando o Eclesiastes, de que há um tempo para tudo, um tempo para construir e “um tempo pra que o vento quebre a vidraça solta”. Portanto, eu agora me movimento com maior facilidade em meio às marés inconstantes de energia, ideias e entusiasmos às quais continuo tão sujeita. De quando em quando minha mente ainda se transforma num parque de diversões de luzes, risos, sons e possibilidades. O riso, a exuberância e a espontaneidade me preenchem e acabam derramando sobre os outros. Esses momentos gloriosos, cintilantes, duram algum tempo, um período breve, e passam. Minhas altas esperanças e emoções, depois de andar rapidamente pela parte mais alta da roda-gigante, tão de repente quanto surgiram, voltam a mergulhar numa massa exausta, cinzenta e negra. O tempo passa; esses estados de espírito passam; e eu acabo voltando a ser eu mesma. E depois, em alguma hora inesperada, o eletrizante parque de diversões volta à minha cabeça.

De fato, para uma mente inquieta, o botão de alerta deve estar sempre acionado.

segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

Leitura e cães: tudo a ver

Em 2008 fiz uma matéria sobre a Terapia Mediada por Animais e pude acompanhar, com muito prazer, a visita do cão Joe Spencer (comigo na foto) à ala infantil do Hospital São Paulo. A alegria e a descontração originadas pela presença do animal em um território marcado pela dor e pelo sofrimento foram um dos momentos mais encantadores que pude testemunhar. Desde médicos, enfermeiros e funcionários, passando pelos pacientes, até chegar aos acompanhantes e visitantes, não havia quem não parasse para apreciar, mexer ou ao menos olhar o cão. Imagine então a farra que as crianças não faziam quando ele se aproximava e se deixava tocar e acariciar por inúmeras ávidas mãozinhas!

Pois é, no início deste ano, em um consultório, enquanto esperava minha vez de ser atendida, li, com surpresa e satisfação, uma pequena matéria na revista Vida Simples que falava dessa interação entre homem e animal, criança e cão. Os benefícios que essa relação proporciona à saúde emocional do ser humano são mais do que comprovados, só que, agora, essa parceria está indo mais além, estendendo o seu alcance para a escola, por exemplo.

Bom, pelo menos é isso o que a respeitada ONG sueca Iahaio (Associação Internacional da Interação Humano-Animal) sugere, por acreditar que a presença regular de cães encoraja as crianças no desenvolvimento escolar. A entidade, inclusive, realizará, neste ano, uma conferência sobre o assunto, na cidade de Estocolmo (http://www.iahaio2010.org/).

E não é tudo. A prática já vem sendo utilizada na escola primária Saint Michael, situada na cidade de Bournemouth, na Inglaterra. Ali, alunos de sete e oito anos levam seus labradores, yorkshires e vira-latas para a sala de aula, onde lêem em voz alta para eles. Segundo uma das idealizadoras da iniciativa, o interesse pela leitura aumentou na escola, uma vez que “ler para os cães dá às crianças confiança e estímulo à comunicação”.

Cães e leitura. A combinação não poderia ser melhor. E vou mais longe, acho até que essa interação poderia extrapolar ainda mais, alcançando o trabalho, por exemplo. Já vi matérias sobre experiências nesse sentido, mas ainda são um pouco tímidas. Quem sabe mais para frente essa prática, de levar cães, ou qualquer animal de estimação, não se torne um hábito frequente, afinal, seria uma forma de humanizar os ambientes corporativos e empresariais, dando mais leveza, criatividade e bom humor ao trabalho. Eu bem que iria gostar.

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

A poesia no metrô


Meia-noite. Ao meu quarto me recolho.
Meu Deus! E este morcego! E, agora, vede:
Na bruta ardência orgânica da sede,
Morde-me a goela ígneo e escaldante molho.

"Vou mandar levantar outra parede..."
- Digo. Ergo-me a tremer. Fecho o ferrolho
E olho o teto. E vejo-o ainda, igual a um olho,
Circularmente sobre a minha rede!

Pego de um pau. Esforços faço. Chego
A tocá-lo. Minh'alma se concentra.
Que ventre produziu tão feio parto?!

A Consciência Humana é este morcego!
Por mais que a gente faça, à noite, ele entra
Imperceptivelmente em nosso quarto!

Já faz um tempo, mas só agora consegui escrever sobre isso. Ao esperar o trem do metrô na estação Tatuapé, sentido Cortinthians-Itaquera, me deparei com o poema acima – O Morcego –, de Augusto dos Anjos, e que me intrigou bastante, tanto pelo seu teor quanto pela forma com a qual ele estava expresso, ou seja, disposto em letras adesivadas, grandes o suficiente para serem vistas de longe, no alto da parede da plataforma central da estação.

Acabada a leitura, meus olhos percorreram toda a extensão da parede, e vi, com extasiada surpresa, que havia outros poemas ali grafados, todos de autores de língua portuguesa, como Camões, Claudio Manoel da Costa, Mário de Sá Carneiro, Olavo Bilac e Fernando Pessoa, entre outros.

Entretida nas leituras dos poemas, deixei passar alguns trens até me decidir pelo embarque. Afinal, já estava perto de casa, não havia motivo para tanta pressa e, depois, queria saber se aqueles textos já estavam ali há um tempo ou se eram recentes, porque apenas naquele momento é que os havia percebido.

O projeto Poesia no Metrô, pelo que soube depois, teve início em outubro do ano passado, primeiro na estação Vila Madalena, depois em vários pontos das estações da Linha Verde (Vila Madalena-Sacomã) e ainda no interior dos novos trens. Em seguida, as demais estações também passaram a apresentar os poemas, como a do Tatuapé, onde os vi, pela primeira vez.

Apesar da agitação e do corre-corre de todos os dias, características marcantes de uma cidade grande como São Paulo, a idéia é extremamente interessante pelo impacto e por promover o acesso aos mais importantes poemas da nossa língua. Tenho certeza de que, vez por outra, as pessoas dão um tempo na pressa e param para saborear as rimas e a cadência das belas poesias. Além do conhecimento, os textos ´também ajudam a espantar o estresse do transporte coletivo. Que venham mais...


* A foto acima é do site do metrô

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

O paraíso perdido

Falando em bibliotecas, li, recentemente, que a Biblioteca Britânica irá disponibilizar, para download gratuito, cerca de 65 mil livros do seu acervo! É um número considerável, mas nada comparável ao seu acervo, que chega perto de 150 milhões de itens, entre livros, mapas, jornais, partituras, patentes, manuscritos e selos, além de outros materiais, todos acomodados sobre 625 km de prateleiras.

O projeto, financiado pela Microsoft, colocará à disposição obras clássicas da literatura que vão de Jane Austen e James Joyce a Charles Dickens e Thomas Hardy, entre outros expoentes da língua inglesa e universal. A leitura poderá ser feita pelo Kindle, da Amazon.

De belíssima arquitetura, a Biblioteca Britânica é uma das maiores do mundo, contando com um espaço para leitura com capacidade para abrigar 1.200 leitores. Das jóias raras e valiosas do seu acervo, destaque ainda para o caderno de anotações de Leonardo da Vinci, a gravação de um discurso de Nelson Mandela e a Carta Magna.

Essa biblioteca deve ser o paraíso perdido, por isso fico aqui só imaginando o que faria se tivesse a oportunidade de conhecer e frequentar o local. Acho que iria delirar! Bom, quando for a Londres, preciso lembrar de passar por lá...

As obras disponibilizadas poderão ser lidas em inglês, o que, sem dúvida faz uma grande diferença, porque nada melhor do que apreciar um livro no seu idioma original. Para quem curte ler on-line esta é, sem dúvida, uma excelente oportunidade de ter acesso a grandes obras da literatura universal e de praticar a língua inglesa.

Nestes tempos de internet e de tecnologia digital, a iniciativa chega em boa hora.

Para conhecer a biblioteca acesse http://www.bl.uk/

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

A liberdade está nos livros

Outro dia, no trabalho, alguns colegas falavam sobre pesquisa na internet e no quanto a tecnologia favoreceu esse trabalho para estudantes, pesquisadores e público em geral. Até aí, tudo bem, concordo plenamente, eu mesma utilizo esse expediente inúmeras vezes ao dia. A discussão só pegou mesmo, pelo menos para mim, quando um amigo jornalista disse que o filho dele, hoje com um ano, não irá, fatalmente, frequentar uma biblioteca.

Eu me mantinha a distância da discussão, só escutando, mas quando ouvi aquilo fiquei indignada!

– Ele só não irá se você não o incentivar – consegui falar.
– Mas ele não precisará mais ir a bibliotecas para fazer pesquisas, com fazíamos antigamente. É isso o que eu quis dizer.
– Mas eu, por exemplo , não vou a bibliotecas para fazer pesquisas, vou para ler e emprestar livros.

Na hora não me ocorreu, mas eu também podia ter acrescentado que, se ele frequentasse bibliotecas, saberia que elas não se ocupam apenas de pesquisa e leitura, mas também da promoção de diversas atividades como contação de histórias, workshops, oficinas, palestras e cursos, além de outras destacadas intervenções. Privar o filho disso é impedi-lo do contato social e da aquisição de diversos meios culturais.

Ainda bem que nem todo mundo pensa como ele, caso contrário, o acontecimento de ontem não teria tido a menor importância.

A notícia, no entanto, não é nova. Alguns blogs e sites, muito bons, por sinal, como o Orelha do Livro (http://www.orelhadolivro.com.br), da querida Mariana Sanches, já comentaram, mas eu, apaixonada que sou por livros, não poderia deixar de citar a inauguração da Biblioteca São Paulo, que fica no lugar onde antes funcionava a Casa de Detenção do Carandiru, hoje Parque da Juventude.

De arquitetura moderna, colorida e ousada, onde foram acomodados 30 mil livros, 80 computadores, CDs, DVDs, jornais e revistas, além de sete kindle, a biblioteca pretende ser um centro de estímulo à leitura. E, para tanto, o quesito acessibilidade foi amplamente pensado e projetado. No local há mesas reguláveis, adaptáveis a qualquer tamanho de cadeira de rodas, e folheadores automáticos de páginas para pessoas com restrições motoras. Aparelhos que convertem livros normais em Braille ou em áudio também serão disponibilizados a deficientes visuais.

Para atender o público em geral, um time de 50 funcionários foram especialmente treinados para orientar e sugerir leituras e atividades de acordo com o perfil da pessoa.
É por essa e mais outras que eu mal posso esperar para conhecer a biblioteca que, sem dúvida, já tem espaço cativo na minha rotina de bibliólatra. Que bom!

* A foto é do site http://www.flickr.com/photos/mjsilva/4337774189/in/set-72157623248060267/

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

O livro na Avenida

“Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso é, sem dúvida, o livro. Os demais são extensão do seu corpo..., mas o livro é outra coisa, o livro é uma extensão da memória e da imaginação.” (Jorge Luís Borges)

Quando eu era criança, lembro que na época do Carnaval eu e minha irmã pedíamos aos nossos pais que comprassem serpentinas, confetes, máscaras, martelinhos, apitos e bisnagas para brincarmos a festa de momo no quintal e no portão de nossa casa. Era um tempo muito gostoso, em que tínhamos, frequentemente, a companhia de amigos e vizinhos.

Depois, já adolescente, comecei a ir em matinês divertidíssimas no salão do movimento de jovens da igreja Santo Antonio do Pari, no bairro onde morava. Era um ambiente saudável, cuja animação ficava a cargo dos próprios participantes do movimento, todos amadores, por sinal, mas que não deixavam a peteca cair, em nenhum momento. Além disso, gostava de acompanhar os desfiles pela TV, improvisando, à minha maneira, os requebros e as evoluções no chão da minha sala.

Carnaval sempre foi uma paixão para mim. Assim, na fase jovem, morando em Indaiatuba, no interior de São Paulo, entrei em um bloco e fui realizar meu desejo de desfilar pelas ruas da cidade. A emoção foi tanta que repeti o feito por mais seis anos seguidos: quatro ainda no bloco e dois em uma das escolas de samba do município.

De volta a São Paulo, desfilei também, um ano, pela Mocidade Alegre, concretizando assim o sonho de percorrer a passarela do samba paulista: o Sambódromo do Anhembi. Foi realmente inesquecível, embora muito rápido. É aquela velha máxima: “o melhor da festa é esperar por ela.”

Hoje, há uma semana do Carnaval, essas lembranças me vieram à tona, reavivando o meu espírito carnavalesco – já há um bom tempo adormecido – ao saber que o enredo de uma das escolas de samba do Rio de Janeiro, a Acadêmicos do Salgueiro, tem como objeto de destaque o universo dos livros e da literatura. Achei isso o máximo!

O enredo “Histórias sem fim”, criado pelo carnavalesco Renato Lage, tem tudo para conquistar o grande público na Marquês de Sapucaí, e é uma pena que eu não possa estar lá para ver de perto, mas ainda assim vou conferir pela TV.

Tudo começa na Alemanha, no século XV, com Gutemberg que faz aperfeiçoamento na tipografia e impressão e edita a primeira Bíblia impressa. Serão lembradas outras ferramentas importantes que também deixaram registros desde a Antiguidade, como os papiros e os pergaminhos até os manuscritos copiados à mão pelos monges medievais.
Em seguida, tem início a grande viagem no tempo e no espaço, em que são destacadas antigas civilizações com seus heróis, mitos e deuses. Dom Quixote, reis e rainhas, tramas amorosas da época medieval. A literatura luso-brasileira será também lembrada por meio de romances e poesias, trazendo assim o índio apaixonado por bela portuguesa, a dramática travessia dos navios negreiros e os nossos heróis mestiços e populares.

O mundo do “Era uma vez” dá passagem para o universo infantil, sem esquecer o Pequeno Príncípe, é claro, e haverá referências ao suspense e a ficção. Fechando o desfile, serão exaltados a filosofia e os caminhos do autoconhecimento, com as páginas de um futuro ainda a ser escrito.

Para quem teve oportunidade de ir aos ensaios da escola, além de acompanhar de perto todos os preparativos do desfile, ainda pode preencher um dos quadros de uma grande palavra cruzada montada em um painel gigante, uma parceria entre Salgueiro e Ediouro.

O melhor de tudo, no entanto, é que, além de brindar o público com um espetáculo belíssimo na Avenida, a escola e a editora distribuirão livros para a plateia durante o desfile. Iniciativas dessa natureza são mais do que bem-vindas, principalmente por mostrar a importância do livro nas nossas vidas e estimular o gosto pela leitura. E nada melhor do que uma festa popular para isso.

Se estiver no Rio de Janeiro durante o Carnaval ou for para lá nesses dias, e tiver uma oportunidade, acho que vale a pena conferir o trabalho do Salgueiro. E se quiser cantar junto, aqui vai a letra do samba para já ir aprendendo.


Histórias Sem Fim (Samba Enredo 2010)

Composição: Josemar Manfredini, Brasil do Quintal, Jassa, Betinho do Ponto e Fernando Magaça

Sonhei... no infinito das histórias
Iluminando a memória, me encantei
Brilhou... realidade e fantasia
Como nunca imaginei
Na arte do saber um novo amanhecer
Divina criação, primeira impressão
O livro sagrado da vida
Virtude pra eternidade
A leitura estimulando
A mente da humanidade

Eu viajei nessa magia
De alma e coração
Na fonte da sabedoria
Busquei a minha inspiração

Páginas descrevendo pensamentos
Clássicos, ideais e sentimentos
Romances... aventuras
Quanta riqueza na nossa literatura
O faz de conta inocente da criança
Ficou guardado na lembrança
Mistérios... suspense... emoção
É o hábito de ler, folheando com prazer
Muito além de uma visão
Mensagens de esperança
Clareando a imaginação

Uma história de amor
Sem ponto final
"Academia do samba" é Salgueiro
No "livro do meu carnaval"

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Para não esquecer de Salinger

“Queres saber o que eu gostaria de ser? Isto é, se pudesse escolher?
– O quê?
– Conheces aquele poema:
Quando Duas Pessoas Se Encontram no Centeio. É um poema de Robert Burns.
– Eu sei que é um poema de Robert Burns – respondi. Mas, é claro, não sabia. – Pensei que era
Quando Duas Pessoas Se Procuram no Centeio – disse eu. – Ando sempre a pensar em dois miúdos que brincam num grande campo de centeio, ou, melhor, milhares de miúdos, e não há por ali uma única pessoa crescida a não ser eu. E eu estou mesmo à beira de um grande precipício. O que tenho a fazer é agarrar os miúdos que estão já à beira do precipício, isto é, quando estão distraídos e andam a correr por ali. É nessa altura que eu apareço para os salvar. Gostava de fazer isso o dia inteiro. Seria apenas o vigia do campo de centeio. Sei que é uma parvoíce, mas seria a única coisa que me agradaria. Mas sei que é uma parvoíce.”

Há uma semana morria, aos 91 anos, em New Hampshire, nos Estados Unidos, o escritor J. D. Salinger, criador de um dos personagens mais instigantes da literatura mundial: Holden Caulfield, o jovem perdido de O Apanhador no Campo de Centeio. O livro, lançado em 1951, quando Salinger tinha 32 anos, marcou toda uma geração do pós-guerra, vendeu mais de 60 milhões de cópias e ainda hoje fascina milhares de leitores.

Como andei meio reclusa do blog, não consegui comentar antes, mas não poderia deixar de fazê-lo, começando o texto pela passagem que “explica” o título do livro.

Li O Apanhador já adulta, então, para mim, o impacto não foi tão grande quanto seria se tivesse lido na minha adolescência, época em que os conflitos existenciais, reais ou imaginários, povoam a nossa mente e o nosso corpo em ebulição. Mas, mesmo assim, não pude deixar de me sentir tocada e entender o porquê deste livro ter se tornado um clássico que se perpetua de geração em geração.

A obra narra um fim de semana da vida do jovem Holden Caulfield. Estudante de um internato para rapazes, onde levou “bomba” em quase todas as matérias, ele acaba voltando mais cedo para casa. No caminho, Holden se prepara para a bronca que fatalmente levará dos pais e pensa na sua vida, no mundo e no que poderá lhe acontecer no futuro. Encontra-se com algumas pessoas das quais gosta, procurando, inconscientemente, retardar, o mais que pode, o confronto com a família.
Nada demais, sem dramas ou tragédias, apenas a história de um adolescente e de seus conflitos internos. A forma como Salinger narra isso, porém, é o que fascina. Ele consegue mostrar, de forma bastante natural, a visão de um jovem, seus sentimentos, suas dúvidas, seus medos, suas idéias, enfim, toda sua maneira de ser e de pensar numa das fases mais decisivas e fundamentais da vida.

Um detalhe curioso na história desse livro é sua relação com a morte de John Lennon. O assassino do beatle, Mark David Chapman, carregava o livro no bolso no dia em que cometeu o crime. Ele disse que estava lendo O Apanhador minutos antes de tentar o suicídio e que a obra lhe havia inspirado matar Lennon.

Mais misterioso ainda, é o fato de o atirador que tentou matar o presidente americano, Ronald Reagan, disse que também havia se inspirado no livro para cometer o assassinato.

Coincidências ou não, acredito que o livro, por si só, não teria esse poder. A história não tem esse tom de incitamento a atos criminosos ou à violência. De qualquer forma, acho que é mais um dos muitos folclores que envolvem o livro para tentar entender e justificar o seu sucesso até hoje. Para tirar a dúvida, só mesmo lendo.

quarta-feira, 3 de fevereiro de 2010

Apego ao texto

Janeiro comecei meu trabalho na agência com todo o gás. Foram três revistas para fechar, ao mesmo tempo, em menos de um mês: ImplantNews, PerioNews e OrtodontiaSPO. Além do trabalho da redação, ainda tive de me ocupar de revisão, como já comentei aqui em post anterior, por causa das férias da minha colega de departamento.

Toda essa correria se justificava pelo fato de que no final de janeiro teria início o Ciosp, o Congresso Internacional de Odontologia de São Paulo, já em sua 28ª edição, que reúne anualmente, no Anhembi, quase 70 mil cirurgiões-dentistas e estudantes, além de 200 expositores, entre estes a agência para a qual trabalho e que publica aquelas revistas que citei no começo.

Isso não me afetaria tanto se não fosse por outra pressão que sofri nos últimos dias e que me afastou um pouco deste blog. É que o prazo de entrega do segundo trabalho da pós em Jornalismo Literário terminava no dia 1º de fevereiro e eu nem havia decupado as três fitas com as entrevistas para o perfil que pretendia escrever sobre o jornalista e professor Álvaro de Moya, considerado como um dos maiores estudiosos em histórias em quadrinhos no Brasil e organizador do livro Shazam! Este, reúne ensaios de vários autores que discorrem sobre diferentes aspectos das HQs. O principal deles é o histórico, com descrição ou menção dos principais quadrinhos do mundo.

Corri o mais que pude e por fim consegui dar conta de tudo. A última etapa foi a redação do perfil que, sabe Deus como, escrevi na tarde do último dia da entrega. Tanta correria, no entanto, teve suas consequências, porque o texto foi com alguns errinhos, percebidos no dia seguinte, quando fiz uma nova leitura da matéria. Apesar disso, senti-me satisfeita com o resultado, porque foi o primeiro perfil que fiz e acho que não me sai mal.

O que senti, na verdade, foi um grande desejo de continuar escrevendo o texto, buscando melhorá-lo cada vez mais, para mim, pelo menos, porque o orginal – e o que vai valer mesmo para a nota – já tinha enviado.

Escrevi aqui que quando termino a leitura de um livro, ainda me sinto envolvida pela história e pelos personagens muitos dias depois, como se fosse difícil abandoná-lo. E é difícil mesmo! Afinal, a convivência no período de leitura é intensa e aquele livro fez parte da minha rotina, da minha vida, dividimos a viagem de ida e volta do metrô até o trabalho e casa, ficou na minha cabeça, foi dormir e acordar comigo, isso quando não participou também dos meus sonhos, me entreteu nas salas de esperas, enfim tivemos um convívio forte. Então, deixá-lo de lado até engrenar outro, não é uma tarefa fácil.

E, agora, com o perfil concluído, percebi que o mesmo apego também acontece na escrita. Já entreguei o meu trabalho do curso, mas não consigo deixar de pensar nele, nem em como modificá-lo, em como aprimorá-lo. Vou corrigindo, reescrevendo, remexendo, acrescentando coisas que deixei de lado, eliminando frases a mais, substituindo palavras que não se encaixaram direito. Não sei com que finalidade, mas o fato é que está difícil deixar esse personagem por completo, acho que isso deverá durar mais alguns dias ainda, quem sabe...

Porém, nem tudo está perdido. Acho que, inconscientemente, espero ver a matéria retrabalhada circulando por aí, em outra oportunidade. Se a minha nota for boa, ou seja, acima de 9, é provável que eu seja convidada a enviá-la para o site da instituição, onde poderá ser publicada. É uma primeira batalha – e tanta – a ser ganha. Só que depois disso, uma nova começa. É que o professor responsável pelo site não é o mesmo que irá dar a nota final e, mesmo que ela seja satisfatória, ainda caberá a ele decidir se colocará o texto no ar ou não.

Bom, sem precipitações e antecipações. Mas, seja como for, publicada ou não, pouco me importa, o que vale mesmo é que fiz um perfil, o primeiro, e gostei do resultado final, ainda que esse final não termine nunca e que venha se transformando e se modificando constantemente, a cada dia e sempre.