segunda-feira, 29 de abril de 2013

70 anos do Pequeno Príncipe

Antes que abril termine, preciso mencionar que um dos livros mais encantadores e famosos do mundo está completando, neste mês, 70 anos: O pequeno príncipe, do escritor francês Antoine de Saint-Exupéry, que foi publicado em 1943, nos Estados Unidos.


Fascinada pela história desde a primeira vez que a li, no final dos anos 1970 e início dos 1980, tenho um carinho especial pelo livro e, toda vez que vejo alguma edição diferente e acessível, acabo adquirindo. Acima, alguns dos meus exemplares de O pequeno príncipe junto ao DVD com a adaptação da história para o cinema.
 
Piloto aventureiro, que fazia manobras arriscadas, Exupéry era também escritor de livros para adultos, mas tornou-se mundialmente conhecido pela história do “principezinho” que fala com animais e tem paixão por uma rosa. O livro é recheado de valores filosóficos e poéticos, por isso, encanta tanto crianças quanto adultos
O pequeno príncipe apresenta belíssimas ilustrações em aquarelas feitas pelo autor e foi escrito e desenhado à mão, enquanto Exupéry ouvia a “Sinfonia nº 40”, de Mozart . Foi traduzido para mais de 200 línguas. No Brasil é publicado pela Editora Agira, que chega a vender 300 mil exemplares por ano.
A história do garoto tem muitas semelhanças com a história do próprio autor: a raposa do livro, por exemplo, que se torna amiga do príncipe no deserto, é relacionada a raposa que Exupéry disse ter visto quando sofreu um acidente de avião. Além disso, tanto o principezinho quanto o escritor desapareceram misteriosamente: o garoto depois do encontro com a serpente; já o autor, em uma missão aérea um ano depois do lançamento do livro.
Abaixo, algumas belas frases da obra que, sem dúvida, ficarão para sempre na nossa memória:
Se tu vens, por exemplo, às quatro da tarde, desde às três eu começarei a ser feliz.
É preciso que eu suporte duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas.
Só se vê bem com o coração. O essencial é invisível aos olhos.
O amor é a única coisa que cresce à medida que se reparte.
Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós.
Muito lindo!

terça-feira, 23 de abril de 2013

Pra celebrar o Dia Mundial do Livro

Dentre os instrumentos inventados pelo homem, o mais impressionante é, sem dúvida, o livro. Os demais são extensões de seu corpo. O microscópio e o telescópio são extensões da visão; o telefone uma extensão da voz e finalmente temos o arado e a espada, ambos extensões do braço. O livro, porém, é outra coisa. O livro é uma extensão da memória e da imaginação.
 
Em «César e Cleópatra» de Shaw, quando se fala da biblioteca de Alexandria, diz-se que ela é a memória da humanidade. O livro é isso e também algo mais: a imaginação. Pois o que é o nosso passado senão uma série de sonhos? Que diferença pode haver entre recordar sonhos e recordar o passado? Tal é a função que o livro realiza.
(...) Os leitores acabam enriquecendo o livro. Se lemos um livro antigo, é como se o tivéssemos lido durante todo o tempo transcorrido entre o dia que foi escrito e o nosso tempo. Por isto convém manter o culto ao livro. O livro pode estar cheio de erratas, podemos não concordar com as opiniões do autor, porém ele conserva algo de sagrado, de divino, não de modo supersticioso, mas com o desejo de encontrar a felicidade, de encontrar a sabedoria.
 
Extraído de "O livro" de Jorge Luis Borges.

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Contos - e conto - de Lygia

Quem me vê lendo e falando sobre livros tem a impressão de que já li os principais autores e obras da literatura... se não a universal, pelo menos a brasileira. Bem que gostaria, mas na minha trajetória de leitora há lacunas profundas que, pouco a pouco, venho tentando cobrir. Uma delas é a obra de Lygia Fagundes Telles, a grande dama da literatura nacional. Pouca coisa li, mas o que caiu em minhas mãos foi o suficiente para apreciar seu talento, como Antes do Baile Verde, livro de contos.
 
Publicado em 1970, os contos constantes nessa coletânea – 20 ao todo – foram escritos entre 1949 e 1969, e extraídos – exceto os inéditos de 1969 – de quatro livros da autora: O cacto vermelho, de 1949, Histórias do Desencontro, de 1958, O jardim selvagem, de 1965, e Os 18 melhores contos do Brasil, coletânea de trabalhos premiados no I Concurso Nacional de Contos (Paraná), de1969.
“São contos escritos no decorrer desses vinte anos e agora enfeixados em ordem decrescente – os últimos serão os primeiros”, adverte Lygia no início da obra.
Os três primeiros contos do livro – Os objetos, Verde lagarto amarelo e Apenas um saxofone me surpreenderam de tal maneira que não consegui parar de ler até chegar ao seu final. Somente ali é que os desfechos, com perdão do pleonasmo, se completam totalmente. Não pude deixar de ficar de queixo caído, pois os desenlaces, que parecem não acontecer, são conhecidos apenas na linha final.
Em Os objetos é travado um diálogo entre um homem e uma mulher sobre os objetos comprados, os seus valores e suas representações. É um significativo apelo aos sentidos do existir, da função das coisas, que passam a ter razão de ser quando são utilizadas para o seu fim:
... Veja, Lorena, aqui na mesa este anjinho vale tanto quanto o peso de papel ou aquele cinzeiro sem cinza, quer dizer, não tem sentido nenhum. Quando olhamos para as coisas, quando tocamos nelas é que começam a viver como nós, muito mais importantes do que nós, porque continuam. O cinzeiro recebe a cinza e fica cinzeiro, o vidro pisa o papel e se impõe...
... Eles precisam ser olhados, manuseados. Como nós. Se ninguém me ama, viro uma coisa ainda mais triste do que essas, porque ando, falo, indo e vindo como uma sombra. Vazio. É o peso do papel sem papel, o cinzeiro sem cinza, o anjo sem anjo, fico como aquela adaga ali fora do peito. Para que serve uma adaga fora do peito?...
Já em Verde lagarto amarelo dois irmãos, já adultos, conversam, o mais velho e calado, Rodolfo, e o caçula e animado, Eduardo, que era o preferido da mãe. Sempre à sombra do irmão, Rodolfo tinha como trunfo o fato de ser escritor, até que... Bom, é melhor ler o conto.
E Apenas um saxofone conta a história de uma mulher velha e rica, que tinha um homem rico que a sustentava, um jovem que lhe satisfazia e um professor espiritual com quem dormia. Apesar disso, vivia infeliz e se indagava sempre sobre por onde andava o grande amor que tivera, um saxofonista totalmente dedicado a ela e que satisfazia todas as suas vontades, até mesmo as mais exdrúxulas.
Depois destes surge Helga, igualmente impactante pela história de um rapaz do sul do país que vai para a Alemanha e se vê em meio à guerra. Passado tempo conhece Helga, uma mulher com uma perna ortopédica que terá triste fim. Assim, como este os demais contos tem uma estrutura com diálogos entre duas pessoas e giram em torno das relações humanas, do desencanto, do amor, do casamento, do adultério, da velhice, da solidão...
Há ainda um flerte com o realismo mágico em A caçada, na qual um homem em visita a uma loja de antiguidades encontra uma tapeçaria velha onde encontra alguma lembrança que não reconhece. Fica tão fascinado com a imagem que retorna com frequência à loja para observar a tapeçaria, sentindo-se cada vez mais atraído e como parte do objeto.
Em Antes do baile verde, conto que dá título à coletânea, em meio aos festejos e animação do carnaval entre Tatisa, uma moça que prega lantejoulas em sua fantasia para o baile, ajudada pela sua empregada, esta em constante inquietação para encontrar seu homem, o pai da moça agoniza no quarto ao lado já em proximidade da morte.
Outros contos também são bem impressionantes, como Venha ver o pôr do sol, no qual um rapaz suplica à antiga namorada para que se encontrem uma vez mais. Cedendo aos apelos ela vai ao seu encontro, marcado num lugar distante, próximo a um cemitério. Ali, ele leva a garota até o jazigo da sua suposta família, de onde, ele diz, avista-se o mais bonito pôr do sol.

E, ainda, O jardim selvagem, no qual tio Ed casado com Daniela, refere-se a ela como um jardim selvagem. A moça gosta de andar a cavalo e vive constantemente com uma luva em uma das mãos. Em dado momento é surpreendida pela empregada ao dar um tiro na cabeça do cachorro da família. Em sua defesa, Daniela diz que o cão estava doente e, assim, colocou um fim em seu sofrimento. Com o passar do tempo, tio Ed fica doente, e Daniela se desvela em sua cabeceira, mas...
Lygia Fagundes Telles é uma escritora consagrada e pioneira nos direitos da mulher. Paulistana, estudou na Escola Superior de Educação Física e na Faculdade de Direito do Largo São Francisco. Participou das rodas literárias que se formavam nos cafés e livrarias ao redor da faculdade, frequentadas por Mário e Oswald de Andrade, Paulo Emílio Sales e outros intelectuais.
Em 1982 foi eleita para a cadeira 28 da Academia Paulista de Letras e, em 1985, a cadeira 16 da Academia Brasileira de Letras. Entre suas principais obras publicadas estão Ciranda de pedra (1954), As meninas (1973), A disciplina do amor (1980), As horas nuas (1989), A noite escura e mais eu (1996) e Invenção e memória (2001). Seu livro mais recente é Passaporte para a China, crônicas de viagem, publicado em 2011 pela Companhia das Letras.
Lygia recebeu diversos prêmios literários, entre eles o Jabuti (1965), o APCA (1974 e 1980) e o Camões (2005), o mais importante da literatura em língua portuguesa, pelo conjunto de sua obra. Uma dama; nossa dama.

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Metáforas do cotidiano

O corre-corre da vida diária, muitas vezes, não nos permite parar, reparar, refletir e tecer comentários sobre os acontecimentos do cotidiano, por mais banais que eles possam parecer, em uma primeira vista. O destinar-se tempo para esses exercícios de observação não é muito comum e até passam despercebidos, mas, se feitos, provocam uma avalanche de sentimentos que julgávamos ser incapazes de descobrir e de vivenciar.
 
Quando há quase três anos cursei a pós-graduação em Jornalismo Literário essa percepção estava mais aguçada, afinal, as aulas eram permeadas da necessidade de se observar e sentir o mundo de forma que isso se refletisse nos textos jornalísticos que produzíamos. Terminado o curso, pouco a pouco essa leveza e sensibilidade foram perdendo a intensidade em mim, caí novamente na rotina, era inevitável... até que me deparei com Deslimites. Metáforas do Cotidiano, livro publicado pela Editora do Autor, assinado pela jornalista Juliana Damante, que foi minha companheira de turma no curso.
O livro traz, em sua maioria, textos extraídos do blog, de mesmo nome, que Juliana manteve de 2007 a 2012. A necessidade de perenizar a escrita, fez com que ela transportasse o que era virtual para as páginas impressas de um livro, como explica no início da publicação: “Resolvi entender que o mundo virtual nada mais é do que uma nuvem a ser apagada por um sopro erroneamente técnico. Decidi que as páginas de um livro têm muito mais sabor do que a tela de um computador. Falando em sentimento, prefiro o sentido das letras no papel, guardados na poeira da estante ou à beira da cama, talvez durante um caminho, quem sabe, uma saudade, levado em uma viagem. Dos sonhos, esse aqui é um”.
Os textos, repletos de observações e metáforas do cotidiano de Juliana, trazem embutidos um pouco da sua trajetória, do seu amadurecimento, da sua busca incessante pelo sentido da vida, mas sempre carregados da sensibilidade que lhe é nata. São belas e tocantes vivências, de coisas simples, do dia a dia, que conseguimos vislumbrar com perfeição como no texto “Pastel de Feira”:
Terça é Feira. Enquanto as frutas estão novas e com gotículas da água que o feirante jogou por cima, para que os vegetais fiquem com ar de frescos e convidativos, os senhores e senhoras arrastam os carrinhos, de feira. A criança corre atrás da pomba, gritando para que voe, voe logo, bem alto. Depois ri... O óleo dos pastéis está borbulhante e muitos escolhem-no para forrar o estômago de café da manhã.
Outros caminham, caminham, circulam, olham o morango vermelho por cima e verde por baixo, a manga cheirosa, o abacaxi já cortado em fatias suculentamente ácido, as maçãs tão perfeitas quanto à da Branca de Neve, o cheiro forte do peixe fresco já com as moscas a rondar, os queijos e laticínios naturais sem soda caústica, a banana amarela cheia de pintas no ponto, a melancia vermelha inteira por dentro e verde listrada por fora...
Em outros textos me vi inserida por ter compartilhado a experiência com Juliana durante as aulas da pós-graduação, como a da disciplina Pauta e Produção, do professor Edvaldo Pereira Lima, coaching do livro. A atividade se estendeu com uma visita ao Museu da Língua Portuguesa, onde deveríamos, em trio, escolher um personagem para acompanhar e, assim, desenvolver a técnica da “observação camuflada”, apenas observar, sem anotar nada. Depois, de volta à sala de aula, e utilizando a técnica da escrita rápida, deveríamos escrever o que tínhamos registrado mentalmente da visita do nosso personagem. Eu fazia parte do grupo da Juliana e escolhemos dois garotos para observar. Fiz apenas um texto informativo, sendo que das três foi ela quem chegou mais perto do âmago do exercício. Seu texto, reproduzido no livro, começava assim:
O garoto tem em média 12 anos, sabia? E levou outro amigo. O mais importante era que, pela segunda vez, ele estava ali. Pela segunda vez, ele repetia. Para mim, para nós e para os outros. A sensação do momento era apertar a tela em busca das palavras indígenas. Mas cansa. Criança cansa. Enjoa fácil de uma cena de repetição em série. Na verdade, o prazer de João Victor, com c, era falar para todos que o amigo dele estava ali pela primeira vez...”
Ler Deslimites. Metáforas do Cotidiano foi uma delícia, que fiz sem notar o tempo, reavivando em mim uma sensibilidade já adormecida para as questões simples da vida, do cotidiano, do nosso dia a dia. Muito bom!
*A capa do livro é de Lu Matosinho, com fotografia de Juliana Damante.

Pra quem desejar adquirir o livro acesse aqui https://www.clubedeautores.com.br/book/141294--Deslimites

terça-feira, 9 de abril de 2013

Vem aí o Paulicéia Literária 2013


Os festivais literários têm uma tradição forte na Europa, onde são realizados praticamente um a cada semana. No Brasil, de uns anos para cá, essa prática começou a ganhar corpo, transformando-se hoje em uma febre. Nada, é claro, que se compare aos países europeus, mas já apresentando números expressivos. Para se ter uma ideia, em 2012 foram 200 festivais e feiras literárias, segundo o calendário organizado pela Fundação Biblioteca Nacional (FBN).
 
Apesar da realização da Bienal Internacional do Livro, São Paulo ainda está – ou estava – a dever nesse quesito, ou seja, na promoção de festivais que, mais do que a venda de livros, traz mesas, debates e oficinas, nos moldes da Festa Literária Internacional de Paraty, uma das mais tradicionais e charmosas do país e que acontece anualmente.
Eu disse “ou estava” porque, numa iniciativa da Associação dos Advogados de São Paulo (AASP) vem aí o Paulicéia Literária 2013, o festival que a capital paulista sediará de 19 a 22 de setembro. A proposta é fortalecer os laços que interligam a literatura ao mundo jurídico; mas não somente. “O evento pretende contribuir para despertar o interesse dos advogados e do público em geral pela literatura como um evento que se insira na agenda cultural da cidade”, destaca Christina Baum, curadora do Festival.
 
A iniciativa da AASP faz parte das comemorações dos 70 anos da entidade, que congrega mais de 90 mil advogados, constituindo-se, de acordo com Sérgio Rosenthal, presidente da associação, na segunda maior do mundo por adesão espontânea. Localizada no centro de São Paulo, a AASP, além da promoção de cursos e eventos culturais, possui uma das mais completas bibliotecas de obras jurídicas.
Festival
 
A programação do Paulicéia Literária 2013, cujo nome é bastante sugestivo por se inserir no cenário paulistano, trará mesas literárias, oficinas e grupos de leitura. Será realizada no auditório e salas da AASP, cuja sede fica à Rua Álvares Penteado, nº 151, bem no coração de São Paulo, o que, sem dúvida, contribuirá para revitalizar o centro velho da capital paulista.
A cada edição do Paulicéia Literária haverá um “Autor em foco”, como acontece na Flip, e cuja obra será tema de alguns eventos ao longo do festival. Para esta primeira edição, a homenageada será a escritora Patrícia Melo, que abrirá o festival no dia 19 de setembro.
Autora principalmente de obras policiais, Patrícia é conhecida por seus livros dedicados a analisar a mente de criminosos. Em 2001 ganhou o Prêmio Jabuti de Literatura por seu trabalho em Inferno.  
Além de Patrícia Melo, mais 12 autores confirmaram a presença na Paulicéia Literária 2013: Miguel Souza Tavares e Valter Hugo Mãe (Portugal), Philippe Claudel (França), Richard Skinner (Reino Unido), Scott Turow e William Landay (EUA), Juan Pablo Villalobos (México), que na ocasião lançará seu novo livro Se vivêssemos em um lugar normal, e os brasileiros Alberto Mussa, Maria José Silveira, Michel Laub, Tony Bellotto e Laurentino Gomes, que lançará no festival 1889, o último livro da trilogia sobre a construção do Brasil no século 19.
O mundo jurídico dará o tom do evento, mas ele não se restringirá apenas a esse universo. Haverá mesas literárias como a que homenageia a escritora Lygia Fagundes Telles, que se formou na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, sendo uma das mulheres pioneiras na área jurídica e que neste mês completa 90 anos de vida. Além desta, a programação terá a Paulicéia estilhaçada, mesa sobre livros de ficção que têm São Paulo como cenário, entre outras.
 
Mais voltadas aos advogados, haverá três mesas temáticas: Advogado do diabo (com temas polêmicos do mundo jurídico), Shakespeare e a lei (que será conduzida por advogado, escritor e ator) e Advogado, profissão: escritor (que tratará de romances policiais escritos por advogados).
A programação contempla ainda duas oficinas literárias: uma ministrada por Patrícia Melo e direcionada para advogados e outra aberta ao público em geral, conduzida pelo escritor britânico Richard Skinner, diretor e professor da Faber Academy. Os temas ainda estão sendo preparados.
 
Como parte do Paulicéia Literária, a partir de maio serão organizados grupos de leitura, com encontros semanais coordenados por um mediador para debater o conteúdo de algum livro de um dos autores convidados. Esses eventos serão gratuitos e anunciados previamente pelo site do festival (www.pauliceialiteraria.org.br). Os encontros acontecerão na sede da AASP e nas lojas da Livraria Cultura, parceira do evento e livraria oficial do festival.
A programação completa será divulgada na primeira semana de agosto, antes do início da venda de ingressos para as mesas e oficinas, que será aberta dia 19 de agosto. É aguardar.

quarta-feira, 3 de abril de 2013

Há 230 anos nascia Washington Irving

Anos atrás, quando assisti em vídeo A lenda do cavaleiro sem cabeça eu nem imaginava que o filme se baseava em uma obra literária e muito menos que essa obra fosse de autoria do escritor norte-americano Washington Irving. Pior, eu nem conhecia o autor.
 
Esse desconhecimento, no entanto, perdurou anos até que há cerca de um ano descobri que Washington Irving nasceu há exatos 230 anos, em 3 de abril, o mesmo dia em que eu nasci. A coincidência levou-me a saber mais sobre o escritor e sua obra e qual não foi minha surpresa quando me deparei com A lenda do cavaleiro sem cabeça (The legend of Sleepy Hollow) que, aliás, é bem diferente da adaptação feita para o cinema. O filme, caso raro, pareceu-me mais interessante que a obra, na verdade um conto em que o autor mistura lendas, mitos e tradições.
Escrita em 1820, a narrativa, segundo estudiosos e comentaristas, firmou um padrão e um modelo de escrita que marcou decisivamente as gerações de escritores norte-americanos que se seguiram. E isso se deve ao estilo adotado por Irving, que mescla fábula, lenda e narrativa de ficção, aliados a elementos do sobrenatural e do gótico.
 
Em A lenda do cavaleiro sem cabeça o desconjuntado, erudito e pedante Ichabod Crane, professor do vilarejo de Sleepy Hollow (vale sonolento), situado a 40 km ao norte de Manhattan, trava uma ”batalha” com o vigoroso e brincalhão Brom Bones pela mão da rica herdeira e bela donzela Katrina van Tassel. Como pano de fundo, a misteriosa lenda do cavaleiro sem cabeça, que povoa a imaginação dos moradores da região.
Talvez por se tratar de um conto, uma história curta, ou quem sabe pela inevitável comparação com a adaptação para o cinema de Tim Burton e estrelada por Johnny Depp, a história me decepcionou um pouco. Achei que a lenda do “cavaleiro sem cabeça” ficou obscurecida, quase relegada, só aparecendo mais ao final da história, sem atinar se é real ou não. Pode ser que esta seja a intenção do autor.
Mas para minha agradável surpresa, na mesma edição em que li A lenda..., havia outro conto de Irving: Rip van Winkle, esta sim uma narrativa que valeu a pena ler. A história é ambientada na época em que os Estados Unidos passam da condição de colônia do Reino Unido para nação independente, portanto um período marcante da história norte-americana.
 
Na época, van Winkle, um personagem folgazão, mas simpático e estimado por todo o povoado, tem em seu encalço a esposa, uma “fera” como é descrita e que lhe cobra uma atitude mais pró-ativa. Em um de seus passeios, van Winkle adormece próximo ao rio Hudson, em um lugar povoado por lendas, numa época histórica (colônia) e acorda em outra (nação independente), já velho e ultrapassado. Ao voltar para o vilarejo, tudo está diferente, até as pessoas são outras. E, quando questionado pelos moradores quem ele é, van Winkle responde:
– Só Deus sabe – exclamou, no limite da razão. – Eu não sou eu... eu sou outro... sou eu acolá... não... aquele é alguém metido nos meus sapatos. Eu era eu a noite passada, mas adormeci na montanha. Eles trocaram minha espingarda e tudo mudou... e eu mudei. Não posso dizer qual é o meu nome nem quem eu sou!
A narrativa é elegante, envolvente, bem traçada, unindo tradições, costumes e lendas de um povoado rural marcado pela colonização holandesa nos Estados Unidos.
Os dois contos são narrados, ou melhor, foram encontrados nos escritos de Diedrich Knickerbocker, velho cavalheiro de Nova York, muito curioso pela história holandesa da província e pelos costumes dos descendentes de seus primitivos colonizadores. Na verdade, um pseudônimo de Washington Irving, um personagem de ficção.
O autor nasceu de uma família nova-iorquina, abastada e grande, de origem escocesa. Formou-se em Direito, mas foi nas Letras que ganhou prestígio, possuindo uma vasta obra que se estende pelo jornalismo, crônica, ensaio, biografia, história e prosa de ficção, com destaque para narrativa curta.
 
Seu livro mais conhecido internacionalmente é a coletânea The skeath book of Geoffrey Crayon (1819-1820), influenciado pela obra do escritor escocês – e amigo pessoal - Walter Scott. A lenda do cavaleiro sem cabeça e Rip van Winkle  se encontram na coletânea.
Washington Irving morreu em 28 de novembro de 1859, em Tarrytown, onde foi sepultado no cemitério de Sleepy Hollow.