segunda-feira, 31 de dezembro de 2018

Retrospectiva Literária 2018


Em 2018 não li tanto quanto gostaria, mas li intensa e prazerosamente. Prossegui nas leituras de escritoras mulheres, mas sem perder os autores homens de vista. O bom é sempre o equilíbrio. Algumas releituras me deram muito prazer, como  O Estrangeiro, de Albert Camus, e A Revolução dos Bichos, de George Orwell, sempre atuais. E adentrei em outros territórios, conheci novos autores e li livros há muito pretendidos.  2018 chega ao fim na certeza de que li o melhor que pude, mas prometendo mais, ainda mais.

Vamos então a Retrospectiva Literária deste ano.

A fantasia que me encantou:


Memórias de Porco-Espinho, de Alain Mabanckou

Conheci Alain  na Flip – Festa Literária Internacional de Paraty deste ano. Uma simpatia. Autor congolês, com dupla nacionalidade franco-congolês, Alain revisita nesse livro histórias da tradição oral da sua infância, dando voz a um porco-espinho assassino que seria o duplo nocivo do jovem Kibandi. Irônica e terna, essa fantasia te prende do início ao fim. Amei.

O clássico que me marcou:

Pedro Páramo, de Juan Rulfo

Há muito queria ler Pedro Páramo, um livro fininho, que tem uma história bem contada, precisa, sem excessos, e me pergunto por que não o fiz antes? Talvez porque há o momento certo para cada leitura e só em 2018 surgiu a oportunidade. Que bom. Sombras e mistério se misturam, trazendo o melhor do realismo mágico.

O thriller psicológico que me arrepiou:

Canção de Ninar, de Leila Slimani

Leila Slimani foi o nome do ano. Também presente na Flip, ela pode falar da literatura e de Canção de Ninar, livro que pega o leitor no seu início e expõe o lado perturbador na vida das mulheres. Recomendo

O livro que me fez refletir:

Cisnes Selvagens, de Jung Chang

Livraço define Cisnes Selvagens, que revela o lado nada bonito da Revolução Cultural de Mao Tsé-Tung, por meio da trajetória de três gerações de mulheres. Necessário.

O livro que me fez chorar:

Cisnes Selvagens, de Jung Chang

Não poderia ser diferente. Em muitos trechos do livro me peguei emocionada, sem poder conter as lágrimas. A realidade choca e dói.

O livro que me decepcionou:

O Remorso de Baltazar Serapião, de Valter Hugo Mãe

Talvez seja o estilo, talvez eu não entenda, o fato é que no terceiro livro que leio de Valter Hugo Mãe senti a mesma dificuldade que nos anteriores. Ás vezes me parece arrastado e me cansa. Embora aborde um tema extremamente importante e necessário – o modo como as mulheres são vistas e a violência que sofrem -, senti que o autor exagerou na dose e terminouo livro numa desesperança, pelo menos para mim. Mas não desisto dele e ainda continuarei lendo suas histórias.

O livro que me surpreendeu:


O Caderno Rosa de Lori Lamby, de Hilda Hilst

Hilda sempre me surpreende, até quando não a entendo. Nesse livro ela me chocou, mas não no sentido moral, e sim na ternura e delicadeza com que encerrou a história. Gostei muito.

O livro que devorei:

Ponciá Vicencio, de Conceição Evaristo

Delicado e forte; preciso e emocionante. A história de Ponciá me enterneceu, uma mulher comum, como tantas, guerreira, como muitas. Romance lindo da Conceição Evaristo.  


A capa mais bonita:

Nós, de Zamiátin

Linda demais. Aliás, não só a capa, mas a edição é primorosa.

O primeiro livro que li no ano:

O Conto da Aia, de Margaret Atwood

Como de costume sempre leio o livro que ganhei no amigo secreto do Traçando Livros, o clube de leitura do qual participo. E foi começar o ano com o pé direito nas leituras. Distopia terrível, mas belíssima e essencial.

O último livro que terminei:

Ponciá Vicencio, de Conceição Evaristo

Porque eu não queria terminar o ano sem ler Conceição Evaristo. E foi como fechar com chave de ouro. História linda, acho que não vou esquecer tão cedo da Ponciá.

O livro que li por indicação:


Meninos sem Pátria, de Luiz Puntel

Não foi bem uma indicação direta, porque acabei chegando a esse livro por causa da polêmica gerada pela proibição da leitura em uma escola do Rio de Janeiro. Alguns pais consideraram que o livro incitava o comunismo e a escola acatou, retirando do catálogo de leituras. Que tolice! História muito boa sobre a vida de adolescentes exilados com seus pais durante a ditadura militar. Mais que necessário.

A frase que não saiu da minha cabeça:

Chora Catarina, chora!, de Réquiem ao Navegador Solitário.

A frase é recorrente nessa história que me conquistou.  O cenário o Timor Leste, onde Catarina busca recuperar sua fazenda e aguarda a chegada do navegador solitário.

Melhor HQ:

Desconstruindo Una

A HQ conta a história de Una e de outras mulheres vítimas da violência masculina e da impunidade. O texto é amparado por imagens – desenhos – fortes e deastadores, em uma abordagem bastante impressionante. Recomendadíssimo.

O (a) personagem do ano:

I330, de Nós.

No início até me antipatizava com ela, mas ao final I330, uma mulher enigmática, rouba a cena dessa distopia pioneira. Sensacional.

O melhor livro nacional:

Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar

Que história fascinante e que estilo! Raduan Nassar sabe das coisas, pois Lavoura Arcaica é um deslumbre ao narrar a história de André e sua família, dominada pela figura do pai. Maravilhoso.

O melhor livro que li em 2018:


A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera

Esse livro me deixou entregue e eu nem li rápido, por ser muito denso. Tanto melhor porque pude apreciá-lo ainda mais, lendo lentamente cada página, cada linha. Me transportei para Praga naqueles dias e me vi, lado a lado com os personagens, partilhando suas histórias. Lindo demais!

Li em 2018... 30 livros

A minha meta literária para 2019 é:                                                                                 

Ler mais, mais, mais.

Top Cinco:

A Insustentável Leveza do Ser, de Milan Kundera
Lavoura Arcaica, de Raduan Nassar
O Conto da Aia, de Margaret Atwood
Cisnes Selvagens, de Jung Chang
Ponciá Vicencio, de Conceição Evaristo

Menção Honrosa para:

Nós, de Zamitián
Réquiem ao Navegador Solitário, de Luís Cardoso
Pedro Páramo, de Juan Rulfo

E que venham mais e belas leituras em 2019. Feliz Ano Novo a todos!




domingo, 9 de dezembro de 2018

Beleza ferina

Frágil, mas ao mesmo tempo forte: curel e ainda belo. Assim é o livro de Thiago Prada, As Feridas do Cotidiano & Algumas Belezas Frágeis, publicado no segundo semestre deste ano pela Editora Penalux e que surpreende pela delicadeza dos textos curtos e diretos, carregados de histórias e observações do cotidiano, todas inspiradas na vivência do autor.

Com uma diagramação leve e clara, o livro contém 86 páginas, que podem ser lidas em apenas um dia. Eu, entretanto, preferi prolongar o prazer da leitura, apreciando os minicontos com tranquilidade no meu dia a dia. Isso fez da leitura uma experiência bastante agradável e, embora alguns textos sejam tristes e melancólicos, ainda assim trazem uma beleza intrínseca nas entrelinhas.

Alguns desses minicontos eu já conhecia do Facebook, onde o autor publica em seu perfil pinceladas dos textos do livro. Foi lá que li, pela primeira vez, o miniconto Destroços no Quintal, segundo Thiago, inspirado na figura de seu avó. Em três parágrafos, ele exprime emoção no simples ato de varrer as folhas de um quintal, uma tarefa ingrata por causa do vento, traduzindo assim toda uma existência, como na passagem:

“Às vezes parava para olhar ao redor, apoiado no cabo, e se parecia com os destroços de um navio encalhado numa ilha, uma visão de puro encanto para os netos, que imaginavam por quais águas teriam navegado tal embarcação, que agora naufragava aos poucos no destino de uma tarefa que nunca termina, em um quintal que sempre o salvaria do tédio das tardes quentes.”

Há muito mais com que se deleitar no livro. Vale a leitura!

Thiago Prada é um jovem escritor, poeta e professor, formado em Psicologia, pós-graduado em Filosofia Contemporânea e mestrado em Ciências Sociais. Publicou dois livros anteriormente de poesia: Os Céus de Van Gogh e Da Noite Sem Fim – Poéticas sobre Tristezas e Assombros, pela Caligo Editora. 

Sem dúvida uma grande promessa.