“Dos diversos instrumentos do homem, o mais assombroso é, sem dúvida, o livro. Os demais são extensão do seu corpo..., mas o livro é outra coisa, o livro é uma extensão da memória e da imaginação.” (Jorge Luís Borges)
Quando eu era criança, lembro que na época do Carnaval eu e minha irmã pedíamos aos nossos pais que comprassem serpentinas, confetes, máscaras, martelinhos, apitos e bisnagas para brincarmos a festa de momo no quintal e no portão de nossa casa. Era um tempo muito gostoso, em que tínhamos, frequentemente, a companhia de amigos e vizinhos.
Depois, já adolescente, comecei a ir em matinês divertidíssimas no salão do movimento de jovens da igreja Santo Antonio do Pari, no bairro onde morava. Era um ambiente saudável, cuja animação ficava a cargo dos próprios participantes do movimento, todos amadores, por sinal, mas que não deixavam a peteca cair, em nenhum momento. Além disso, gostava de acompanhar os desfiles pela TV, improvisando, à minha maneira, os requebros e as evoluções no chão da minha sala.
Carnaval sempre foi uma paixão para mim. Assim, na fase jovem, morando em Indaiatuba, no interior de São Paulo, entrei em um bloco e fui realizar meu desejo de desfilar pelas ruas da cidade. A emoção foi tanta que repeti o feito por mais seis anos seguidos: quatro ainda no bloco e dois em uma das escolas de samba do município.
De volta a São Paulo, desfilei também, um ano, pela Mocidade Alegre, concretizando assim o sonho de percorrer a passarela do samba paulista: o Sambódromo do Anhembi. Foi realmente inesquecível, embora muito rápido. É aquela velha máxima: “o melhor da festa é esperar por ela.”
Hoje, há uma semana do Carnaval, essas lembranças me vieram à tona, reavivando o meu espírito carnavalesco – já há um bom tempo adormecido – ao saber que o enredo de uma das escolas de samba do Rio de Janeiro, a Acadêmicos do Salgueiro, tem como objeto de destaque o universo dos livros e da literatura. Achei isso o máximo!
O enredo “Histórias sem fim”, criado pelo carnavalesco Renato Lage, tem tudo para conquistar o grande público na Marquês de Sapucaí, e é uma pena que eu não possa estar lá para ver de perto, mas ainda assim vou conferir pela TV.
Tudo começa na Alemanha, no século XV, com Gutemberg que faz aperfeiçoamento na tipografia e impressão e edita a primeira Bíblia impressa. Serão lembradas outras ferramentas importantes que também deixaram registros desde a Antiguidade, como os papiros e os pergaminhos até os manuscritos copiados à mão pelos monges medievais.
Em seguida, tem início a grande viagem no tempo e no espaço, em que são destacadas antigas civilizações com seus heróis, mitos e deuses. Dom Quixote, reis e rainhas, tramas amorosas da época medieval. A literatura luso-brasileira será também lembrada por meio de romances e poesias, trazendo assim o índio apaixonado por bela portuguesa, a dramática travessia dos navios negreiros e os nossos heróis mestiços e populares.
O mundo do “Era uma vez” dá passagem para o universo infantil, sem esquecer o Pequeno Príncípe, é claro, e haverá referências ao suspense e a ficção. Fechando o desfile, serão exaltados a filosofia e os caminhos do autoconhecimento, com as páginas de um futuro ainda a ser escrito.
Para quem teve oportunidade de ir aos ensaios da escola, além de acompanhar de perto todos os preparativos do desfile, ainda pode preencher um dos quadros de uma grande palavra cruzada montada em um painel gigante, uma parceria entre Salgueiro e Ediouro.
O melhor de tudo, no entanto, é que, além de brindar o público com um espetáculo belíssimo na Avenida, a escola e a editora distribuirão livros para a plateia durante o desfile. Iniciativas dessa natureza são mais do que bem-vindas, principalmente por mostrar a importância do livro nas nossas vidas e estimular o gosto pela leitura. E nada melhor do que uma festa popular para isso.
Se estiver no Rio de Janeiro durante o Carnaval ou for para lá nesses dias, e tiver uma oportunidade, acho que vale a pena conferir o trabalho do Salgueiro. E se quiser cantar junto, aqui vai a letra do samba para já ir aprendendo.
Histórias Sem Fim (Samba Enredo 2010)
Composição: Josemar Manfredini, Brasil do Quintal, Jassa, Betinho do Ponto e Fernando Magaça
Sonhei... no infinito das histórias
Iluminando a memória, me encantei
Brilhou... realidade e fantasia
Como nunca imaginei
Na arte do saber um novo amanhecer
Divina criação, primeira impressão
O livro sagrado da vida
Virtude pra eternidade
A leitura estimulando
A mente da humanidade
Eu viajei nessa magia
De alma e coração
Na fonte da sabedoria
Busquei a minha inspiração
Páginas descrevendo pensamentos
Clássicos, ideais e sentimentos
Romances... aventuras
Quanta riqueza na nossa literatura
O faz de conta inocente da criança
Ficou guardado na lembrança
Mistérios... suspense... emoção
É o hábito de ler, folheando com prazer
Muito além de uma visão
Mensagens de esperança
Clareando a imaginação
Uma história de amor
Sem ponto final
"Academia do samba" é Salgueiro
No "livro do meu carnaval"
Realmente, Ciça, só quem já desfilou naquela avenida para saber o tamanho da emoção.
ResponderExcluirnão sabia que o enredo da Acadêmicos do Salgueiro era esse. Também adorei!
Se depender da força dessas histórias sem fim, tem tudo para ganhar.
ah! a surpresinha está pronta, precisamos nos ver. =)
beijos