quarta-feira, 19 de outubro de 2011

Poeta, poetinha vagabundo

A frase acima, contida na letra da música Samba pra Vinícius, composta por Toquinho, dá uma ideia de quem foi Marcus Vinicius da Cruz e Mello Moraes, ou simplesmente Vinicius de Moraes: uma figura andarilha e volúvel, mas sem dúvida um grande poeta e compositor, que também se aventurou pela diplomacia, dramaturgia e jornalismo.

Se vivo, o poeta estaria completando hoje 98 anos, mas boêmio inveterado, fumante e fã do uísque, partiu aos 67 anos, deixando uma grande obra na literatura, no teatro, no cinema e na música. Apesar desse legado, Eucanaã Ferraz, poeta e professor de literatura, afirma, no livro Vinícius de Moraes, da coleção “Folha Explica”, que “fala-se muito do poeta, mas lê-se insuficientemente sua poesia”. A figura do artista, teria se sobreposto à própria obra.

Pode ser, mas a verdade é que Vinícius de Moraes é um dos meus poetas preferidos. Seus sonetos e poemas, suas letras e composições acompanharam minha adolescência e início da vida adulta muito de perto e ainda estão muito presentes no meu dia a dia. Em 1980, ano da sua morte, uma amiga de faculdade presenteou-me com Para viver um grande amor, obra publicada em 1962 pela Editora do Autor. A edição que ganhei, entretanto, é de 1979, publicada pela José Olympio, e está bem capenga, com as marcas do tempo, das mudanças e das minhas leituras.

É o primeiro livro de prosa do autor, um misto de poemas e crônicas, estas publicadas em jornais e revistas ao longo de 20 anos. Os poemas também foram escritos nesse período e servem para amenizar um pouco a prosa: “dar-lhe um balanço novo”, como o próprio autor assinala no início do livro, em sua Advertência. Juntos, dão ao livro a tônica deste: o grande amor.

Escritas em linguagem despojada e acessível, que retratam o cotidiano, as crônicas me bateram mais forte do que a poesia, se bem que esta também é belíssima. As crônicas, contudo, falaram mais fundo, deixando marcas profundas em meu ser. Entre as crônicas escritas, destaque para a que dá título ao livro, Para viver um grande amor, texto que não se pretende ser uma receita, mas sim a visão do poeta do que se faz para viver um grande amor. Eis um trecho:

Para viver um grande amor, na realidade, há que compenetrar-se da verdade de que não existre amor sem fieldade – para viver um grande amor. Pois quem trai seu amor por vanidade é um desconhecedor da liberdade, dessa imensa, indizível liberdade que traz um só amor.

...

É muito necessário ter em vista um crédito de rosas no florista – muito mais que na modista! – para aprazer ao grande amnor. Pois do que o amor quer saber mesmo, é de amor, é de amor, de amor a esmo; depois, um tutuzinho com torresmo conta ponto a favor...

...

É preciso um cuidado permanente não só com o corpo mais também com a mente, pois qualquer “baixo” seu, a amada sente – e esfria um pouco o amor. Há que ser bem cortês sem cortesia; doce e conciliador sem covardia; saber ganhar dinheiro com poesia – para viver um grande amor.

E por aí vai. Mas é interessante notar que, apesar de todo o romantismo e lirismo, Vinícius de Moraes não se manteve fiel a uma mulher só. Ele se casou nove vezes, mas garante que amou a todas, como se fosse a única, da mesma maneira que propagou na canção Eu sei que vou te amar, em parceria com Tom Jobim, cujos dois primeiros versos diz:

Eu sei que vou te amar
Por toda a minha vida eu vou te amar

Mas também justificando-se, como no final do Soneto de Fidelidade:

Que não seja imortal, posto que é chama
Mas que seja infinito enquanto dure.

É, este é Vinícius de Moraes: poeta e prosador; apaixonado e volúvel; contraditório e único. Leia mais Vinícius.

3 comentários:

  1. sou suspeitissima para falar do branco mais preto desse país. Sou fanzona dele e de todos os seus poemas. Não me importo se foi diplomata, bêbado, mulherengo ... eu amo esse velhinho pelos seus poemas lindos emocionantes.
    Bju

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  2. Pena que se foi tão cedo... Mas deixou para trás uma legião imensa de fãs e apaixonados por seus poemas românticos! ;)


    Beijinhos,
    www.primeiro-livro.com

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  3. Taí alguém que foi embora cedo e deixou muito por dizer.... A biografia dele é bem legal, Ciça, recomento se vc ainda não leu. beijos e boa semana!

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