Hoje é Dia Mundial do Livro, data que teve sua origem na Catalunha, uma região semiautônoma da Espanha. No início era celebrada em 7 de outubro, em comemoração ao nascimento de Miguel de Cervantes, o famoso autor de Dom Quixote, um dos livros mais importantes da literatura mundial.
Porém, em 1930, a data passou a ser comemorada em 23 de abril, dia do falecimento de Cervantes. E, em 1996, a Unesco instituiu este dia como o Dia Mundial do Livro e também do Direito do Autor, por ser o dia também dos falecimentos de outros escritores, como Josep Pla e William Shakespeare.
Mas hoje é, ainda, o aniversário da Silvia, minha amiga de infância, com quem convivi boa parte da minha adolescência até chegar a idade adulta. Uma amizade de quase 40 anos e, embora hoje a gente já não se veja com tanta constância, os laços que nos unem nunca se afrouxaram.
E essas duas datas, a do livro e a do aniversário, me levaram a pensar em uma leitura que fiz recentemente e que me suscitou controversas sensações: Mrs. Dalloway, de Virginia Woolf.
Já faz um bom tempo que desejava ler Virginia, autora consagrada do modernismo, cuja vida tumultuada, marcada por traumas e problemas psicoemocionis marcaram, sem dúvida, sua escrita.
Não sabia bem com qual livro começar até que Mrs Dalloway apareceu tentadoramente na minha frente, assim decidi por ele. Confesso, porém, que não foi uma leitura fácil, uma vez que a autora mescla os acontecimentos com os pensamentos e as reflexões dos seus personagens. A história vai e volta na mente destes, sem pausa, sem respiro.
Por vezes pensei em parar. Enquanto lia, gostava muito, mas devo admitir que quando parava tinha dificuldade em voltar ao livro. Mas como é difícil para mim deixar um livro de lado, insisti – ainda bem.
A história conta um dia na vida de Clarissa Dalloway – a senhora que dá o título à obra –, enquanto ela prepara uma festa em sua casa para logo mais à noite. Entre suas relfexões e lembranças a cerca da sua vida e das escolhs que fez, misturam-se outros personagens, também com suas lembranças e reflexões, que podem retroceder no tempo, mas voltando sempre ao presente.
Clarrisa Dalloway – e aqui entra Silvia – lembrou-me muitas vezes a minha amiga aniversariante, em diversas situações, como sua vida atual, cercada de festas e compromissos sociais, e seus questionamentos sobre o que poderia ter sido sua existência se as coisas tomassem outro rumo. A ligação com os amigos mais queridos, o dia da festa em que quase não deu atenção a estes, mas pedindo para que ficassem até o final para poder lhes falar, tudo isso me lembrou a atual vida da Silvia. Era como se Clarrisa fosse ela e ela fosse Clarissa, como na passagem:
"O vestíbulo da casa estava fresco como uma cripta. A Sra. Dalloway levou as mãos aos olhos, e, enquanto a criada fechava a porta e ela lhe ouvia o rugir das saias, sentiu-se como uma monja que volta ao mundo e sente que tombam sobre a sua fronte os familiares véus e a resposta às velhas devoções. A cozinheira assobiava na cozinha. Ouviu o taque-taque da máquina de escrever. Aquilo era a sua vida, e, inclinando a cabeça para a mesinha do vestíbulo, curvava-se ante a sua influência, sentia-se abençoada e purificada, e, enquanto tomava o anotador de recados telefônicos, dizia consigo que momentos como aqueles eram botões da árvore da vida, eram flores da escuridão, pensava (como se alguma linda rosa acabasse de florescer unicamente para seus olhos); nem um só momento acreditara em Deus; mas uma razão, pensou com o anotador suspenso, para agradecer, na vida diária, às criadas, sim, aos cachorros e canários, e principalmente a Richard, seu marido, no qual tudo repousava – pelos alegres rumores, pelas luzes verdes, pelo assobio da cozinheira, pois a Sra. Walker era irlandesa e assobiava todo o dia – para agradecer-lhes por aquele secreto espírito de deliciosos momentos, pensou, erguendo o anotador...”
A leitura, ao final, caiu muito bem, já que não tive como ficar indiferente. Me identifiquei bastante com a história e com os personagens, com os quais conviverei ainda por um bom tempo, como se eles fossem meus íntimos e eu íntimas deles.
Mrs. Dalloway é, sem dúvida, um bom livro para se lembrar o Dia Mundial do Livro.
* Leia também o post de Mônica Carreiro sobre o livro em no blog Ler é o melhor prazer - http://lereomelhorlazer.blogspot.com/2011/04/mrs-dalloway.html?
Que lindo!Bravo!Bravo!Bravo!
ResponderExcluirVerossemelhança e intertextualidade.
É por isso que sinto atração pelos clássicos, eles estão no nosso dia-a-dia. Eu, você e Silvia somos Clarice.
Nunca desista de um clássico, a razão de sua existência é inimaginávele, pense, ele só existe se a gente o ler. Fechado, guardado ele não passa de um livro qualquer.
Adorei sua resenha,
Boa leitura
Oi, Cecilia! Eu também gosto muito de "Mrs. Dalloway", é um livro interessante e muito diferente dos romances tradicionais, pois a forma como Virginia Woolf desenvolveu a história marcou muito a literatura moderna. É realmente um livro inesquecível e que vale ser lembrado neste dia especial.
ResponderExcluirUm beijo
Francine
Excelente. E por coincidencia estou lendo ele tb.
ResponderExcluirabraço
Cecília, também tive dificuldade com Virgínia Woolf, mas acabei me deixando envolver. Também gostei de "Orlando", mas fiquei por aí. Tenho mais coisas dela aqui na fila, qualquer hora eu pego.
ResponderExcluirPS: Dia do livro? que vergonha, não é que eu esqueci? Beijão
Monica, Francine, Vanessa e Denise, obrigada pelo comentários de vocês. Acho que o debate em torno de Mrs. Dalloway e Virginia Woolf está ficando muito bom e produtivo. Beijos!
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