sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

A bolsa

Andar de metrô é, muitas vezes, uma grande aventura, mas também um tormento, sobretudo naqueles dias em que os trens estão lentos. Isso porque já chegam lotados na plataforma abarrotada de gente ansiosa à sua espera, seja para chegar ao trabalho, ao médico, à escola ou ainda a algum compromisso qualquer. Não há humor que resista a esses contratempos no transporte público.

Para minha prima Luci, paulistana de nascimento, mas residente há mais de 20 anos em Porto Alegre, e que recentemente esteve em São Paulo para alguns compromissos, o metrô foi uma benção, que facilitou em muito sua caminhada pelas várias regiões de Sampa por onde o transporte metropolitano passa. Ela não teve do que reclamar.

Para mim, que tenho de me transportar todos os dias por ele para ir ao trabalho, ao curso, à yoga, ao lazer e à minha casa, concordo que me auxilia muito nos deslocamentos que faço, apesar dos problemas que semanalmente apresenta. Além disso, já até comentei aqui, e por diversas vezes, que o metrô tem para mim uma outra função, aquela que me leva ao sonho, solta a minha imaginação e me transporta para outros mundos: a leitura. É ali o meu local preferido para ler, é onde consigo fazer isso melhor.

Ultimamente, porém, descobri outros prazeres no metrô, além desse proporcionado pelos livros. Tenho me pegado, várias vezes, observando o ambiente dentro dos vagões, as pessoas que por eles viajam e ainda os objetos que estas carregam. Brincos, por exemplo, costumam chamar muito a minha atenção. Eu simplesmente adooooro, e fico tonta com tanta variedade que existe, um mais lindo que o outro.

Como não sou de ferro, um belo rosto masculino também é capaz de desviar meus olhos dos livros. Afinal, o que é bonito é para ser apreciado. E para não escapar muito da minha rotina literária, gosto de observar as pessoas que lêem e tentar descobrir que livros estão deixando-as tão compenetradas a ponto de ficarem no trem lotado, de pé, ainda com o exemplar aberto.

Esta semana, no entanto, um outro objeto, não muito comum nos meus interesses, reclamou minha atenção na viagem de volta para casa. Estava sentada comodamente no assento do lado esquerdo do trem, que fica de frente, quando uma moça entrou e se postou em frente à barra de ferro, no assento lateral, perto da porta. Ela vestia uma calça jeans, camiseta branca com detalhes em preto na manga. Era morena, tinha cabelos pretos amarrados em um rabo de cavalo, usava brincos de bijuteria em formato de flor e ainda um piercing na orelha. Um óculos, com lentes retangulares, de armação preta, aumentava um pouco o formato dos seus olhos castanhos escuros.

Nada disso tinha importância, afinal, a não ser por um acessório que ela trazia pendurado no ombro esquerdo: uma bolsa. De aspecto normal, parecia mais uma sacola grande, dessas de pano, com fundo preto, de formato retangular, em que se carrega inúmeras coisas. Sua estampa, coloridíssima, porém, era o que mais se sobressaía, e não poderia ser por outro motivo senão aquele ligado à literatura. Eram desenhos e mais desenhos de livros, enfileirados um sobre o outro ou um ao lado do outro, mostrando apenas a lombada com os títulos à amostra.

Dali de onde estava pude ver A Ilíada, de Homero; Fausto, de Goethe; Iracema e O Guarani, de José de Alencar; Madame Bovary, de Flaubert; Moby Dick, de Herman Melville; e O Grande Gatsby, de F. Scott Fitzgerald. Havia ainda um de Dostoiévski, que não consegui ler o título, assim como outros também. "Será que ela era leitora de todos aqueles clássicos maravilhosos?" – pensei.

Fiquei tão fascinada pela bolsa que não conseguia tirar os olhos dela. Esperava, sim, uma oportunidade de perguntar à moça onde havia conseguido aquela jóia, mas contive meu ímpeto. Nem quando o trem chegou ao meu destino, que por sinal também era o dela, tive a coragem necessária para alcançá-la e indagar. A bolsa sumiu da minha vista, de uma hora para outra, da mesma forma como surgira, misturando-se à multidão e à rotina do metrô. Restou a lembrança.

4 comentários:

  1. aaahhh...que pena que a bolsa se foi...mas ficou a lembrança de uma história muitobem narrada!

    adorei!!

    beijos!! saudades!!

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  2. Hihihihihihih....eu amoooooooooooo o metro.....leio , leio, leio e não participo do stress do transito paulistano

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  3. Ai, que texto gostoso de ler...
    Posso dizer também que o metrô salvou a minha vida durante o curto tempo que fiquei aí... E não apenas o metrô, como vc e Gil, minhas guias... hehe
    Eu teria também, com certeza, reparado na bolsa... Sempre reparo e, se era assim tão linda, com certeza me chamaria a atenção também...
    Belo texto, Ciça... Descrições e observações encantadoras!

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  4. Ciça,que lindeza! Que gostosura esse texto. Beijos, as montanhas de Minas a-s espera-m. Beijos

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