Uma das boas lembranças que guardo da Flip, a Festa Literária Internacional de Paraty vem da sétima edição, realizada em 2009, quando tive a oportunidade de conhecer – de perto – um dos grandes escritores portugueses contemporâneos: António Lobo Antunes, considerado por muitos como o maior escritor lusitano após Eça de Queirós.
O escritor, que também é médico psiquiatra, completa neste dia 1º de setembro 69 anos, e eu não podia deixar de falar sobre ele, principalmente por estar lendo, atualmente, um dos seus romances mais enigmáticos: Ontem não te vi em Babilónia.
Na época da sua participação na Flip eu ainda não tinha lido nenhum livro do escritor, quer dizer, havia tentado ler Os cus de Judas, que me fora indicado por um colega, mas confesso, com certo pesar, não ter ido até o fim, acho até que não passei das 30 páginas iniciais. A narrativa era interessante, mas derrapei na linguagem e senti dificuldade na concentração da leitura. Quando conseguia mergulhar achava maravilhoso, mas dispersava muito e, por isso, abandonei o livro.
Quando Lobo Antunes teve seu nome confirmado para a Festa Literária, apressei-me em comprar o ingresso da mesa, quem sabe conhecendo-o melhor eu me animasse a ler suas obras. Não me arrependi. A mesa do escritor foi uma das melhores que assisti das quatro edições que participei da Flip.
A mesa, mediada pelo jornalista Humberto Werneck, constituiu-se num descontraído bate-papo que divertiu e encantou a plateia, arrancando aplausos entusiásticos a cada comentário. Lobo Antunes relembrou suas raízes brasileiras, citou autores que gosta e falou sobre sua mania de corrigir os textos à “exaustão”: “Para escrever bem é preciso cortar até osso, advérbios, adjetivos, que Cortázar chamava de essas putas.”
Sua receita para escrever é simples e tem relação com o futebol brasileiro: cabeça e, no caso da escrita, mãos. Segundo Lobo Antunes, “a cabeça cria e a mão corrige. Para quem quer ser escritor, recomendo observar Garrincha jogando. É preciso ter a cabeça de um Didi e a habilidade de um Garrincha.”
Saí da mesa fascinada pelo autor e ávida por ler seus livros publicados – hoje mais de 30. Afinal, se eu me encantara com o ser humano, com a pessoa, porque não iria gostar da sua escrita, era uma questão de insistência. No entanto, não o fiz imediatamente, e só agora, dois anos depois, é que resolvi me aventurar pela sua escrita, com a leitura de Ontem não te vi em Babilónia.
A escolha do livro foi por puro acaso, depois de uma rápida “espiada” na comunidade do autor no Orkut. No fórum, um dos tópicos fazia menção ao livro, como o primeiro que um dos membros lera, considerando esta como uma experiência intensa. Foi o suficiente para me interessar e pensei: “quem sabe este não seja um bom começo”.
Ainda não conclui a leitura, cheguei à metade do livro, que tem 440 páginas. Nada mal. Mas devo admitir que continuo sentindo certa estranheza na linguagem e na escrita de Lobo Antunes, por causa da sua sofisticação. A narrativa não é linear, embora se desenvolva entre três personagens principais: Ana Emília, uma mulher que sofre com o suicídio da filha; Alice, ex-enfermeira; e Osvaldo, seu marido, um homem que ganhava a vida perseguindo opositores do regime e da Igreja.
A história começa a partir da meia-noite, quando os três estão, cada um, em seus quartos, rolando insones na cama, relembrando dramas vividos e dolorosos que vão se encadeando e se entrelaçando. São memórias e pensamentos que vão e voltam, que não parecem ter sentido, uma vez que uma lembrança traz outra e mais outra até voltar ao seu início e recomeçar tudo de novo.
Apesar da estranheza das múltiplas vozes em cena, que a certa altura deu um nó na minha cabeça ao ponto de misturar as histórias e de ficar na dúvida se se tratava deste ou daquele personagem, a trama prende a atenção.
Vou, então, insistindo, sem querer abandonar o livro, encarando o desafio de decifrar o extenso quebra-cabeças montado por Lobo Antunes e sua intricada trama de pensamentos, como “aquele que prometeu visitar-me e não visita, vasculhando os planetas extintos, pondo-me nervosa tu, e sabendo que é aqui que você mora.”
Só conheço comentários positivos sobre este autor, mas nunca li nada dele. Esta semana, na Cultura, me segurei, aliás, segurei um livro dele, mas não comprei. Foi o dito Ontem não te vi em Babilônia.
ResponderExcluirAgora fiquei depré por não comprado. Bem, não si pode ter tudo, não é? kkk
Obrigada por mais esta dica.
Bju
Assim como a Mônica, também já ouvi falar muito sobre ele, mas nunca li(acho que é coisa do curso de Letras, haha! Mas eu (ainda) não sou formada em Letras, mas metade de grade da minha graduação (Tradutor e Intérprete) teve matérias de literatura, e inclusive da portuguesa e brasileira), e sabe que eu nunca desisto de um livro, oficialmente, haha. Guardo-o de canto, mas sempre tento me lembrar que ele está lá, sempre penso que devo dar uma chance. Às vezes não é o momento certo, não estamos com humor ou a concentração fica prejudicada por algum motivo. Porque a gente lê para se transportar para outra realidade, mas muito do que julgamos quando lemos um livro, depende de como estamos, das coisas pelas quais estamos passando. Torço para que um dia você consiga voltar, haha! Até porque "Os cus do Judas" é um livro que faz um tempinho que eu descobri que gostaria de ler, até pela temática de guerra, e tudo mais. Ainda criarei, de fato, coragem para isso!!
ResponderExcluirGRANDE beijo!! =D
E "Pelos Olhos de Maisie", pelo menos para mim, foi uma mistura de sutileza (pois a personagem principal é uma criança) com uma realidade adulta por vezes "cruel". Gostei muito porque Henry James jogou na nossa cara muitas coisas que são bem fortes, mas através da sutileza do olhar de uma criança. Eu recomendo bastante, apesar de não ser o meu preferido do autor (ainda fico com "The Portrait of a Lady/Retrato de uma Senhora).
ResponderExcluirTambém não foi fácil entrar no estilo de escrita de A. Lobo Antunes. Muitas vezes tinha que voltar um ou dois parágrafos para traz para poder perceber melhor. No entanto, cada palavra que o autor escreve é pensada ao mais pequeno pormenor, o que torna os seus livros simplesmente magníficos. Tempo e não ter presa de chegar ao fim do livro é aquilo que temos que ter para aproveitar os fantásticos livros do autor.
ResponderExcluirO bom seria sentir aquela atração irresistível para continuarmos a leitura, só pararmos quando as lágrimas do cansaço atrapalham, quando a cabeça sente necessidade de outros mundos fora da literatura. Estes são bons livros. Estou assustado com Lobo Antunes, mas sabemos da necessidade de exercitarmos nosso cérebro afim de o desenvolver. Que idéia faz Paulo Coelhe sobre a escrita de Antunes?!
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