sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Para não esquecer de Salinger

“Queres saber o que eu gostaria de ser? Isto é, se pudesse escolher?
– O quê?
– Conheces aquele poema:
Quando Duas Pessoas Se Encontram no Centeio. É um poema de Robert Burns.
– Eu sei que é um poema de Robert Burns – respondi. Mas, é claro, não sabia. – Pensei que era
Quando Duas Pessoas Se Procuram no Centeio – disse eu. – Ando sempre a pensar em dois miúdos que brincam num grande campo de centeio, ou, melhor, milhares de miúdos, e não há por ali uma única pessoa crescida a não ser eu. E eu estou mesmo à beira de um grande precipício. O que tenho a fazer é agarrar os miúdos que estão já à beira do precipício, isto é, quando estão distraídos e andam a correr por ali. É nessa altura que eu apareço para os salvar. Gostava de fazer isso o dia inteiro. Seria apenas o vigia do campo de centeio. Sei que é uma parvoíce, mas seria a única coisa que me agradaria. Mas sei que é uma parvoíce.”

Há uma semana morria, aos 91 anos, em New Hampshire, nos Estados Unidos, o escritor J. D. Salinger, criador de um dos personagens mais instigantes da literatura mundial: Holden Caulfield, o jovem perdido de O Apanhador no Campo de Centeio. O livro, lançado em 1951, quando Salinger tinha 32 anos, marcou toda uma geração do pós-guerra, vendeu mais de 60 milhões de cópias e ainda hoje fascina milhares de leitores.

Como andei meio reclusa do blog, não consegui comentar antes, mas não poderia deixar de fazê-lo, começando o texto pela passagem que “explica” o título do livro.

Li O Apanhador já adulta, então, para mim, o impacto não foi tão grande quanto seria se tivesse lido na minha adolescência, época em que os conflitos existenciais, reais ou imaginários, povoam a nossa mente e o nosso corpo em ebulição. Mas, mesmo assim, não pude deixar de me sentir tocada e entender o porquê deste livro ter se tornado um clássico que se perpetua de geração em geração.

A obra narra um fim de semana da vida do jovem Holden Caulfield. Estudante de um internato para rapazes, onde levou “bomba” em quase todas as matérias, ele acaba voltando mais cedo para casa. No caminho, Holden se prepara para a bronca que fatalmente levará dos pais e pensa na sua vida, no mundo e no que poderá lhe acontecer no futuro. Encontra-se com algumas pessoas das quais gosta, procurando, inconscientemente, retardar, o mais que pode, o confronto com a família.
Nada demais, sem dramas ou tragédias, apenas a história de um adolescente e de seus conflitos internos. A forma como Salinger narra isso, porém, é o que fascina. Ele consegue mostrar, de forma bastante natural, a visão de um jovem, seus sentimentos, suas dúvidas, seus medos, suas idéias, enfim, toda sua maneira de ser e de pensar numa das fases mais decisivas e fundamentais da vida.

Um detalhe curioso na história desse livro é sua relação com a morte de John Lennon. O assassino do beatle, Mark David Chapman, carregava o livro no bolso no dia em que cometeu o crime. Ele disse que estava lendo O Apanhador minutos antes de tentar o suicídio e que a obra lhe havia inspirado matar Lennon.

Mais misterioso ainda, é o fato de o atirador que tentou matar o presidente americano, Ronald Reagan, disse que também havia se inspirado no livro para cometer o assassinato.

Coincidências ou não, acredito que o livro, por si só, não teria esse poder. A história não tem esse tom de incitamento a atos criminosos ou à violência. De qualquer forma, acho que é mais um dos muitos folclores que envolvem o livro para tentar entender e justificar o seu sucesso até hoje. Para tirar a dúvida, só mesmo lendo.

2 comentários:

  1. ah eu quero ler ! vou colocar na minha listinha !!

    obrigada por nos brindar com textos tão lindos!

    beijos!

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  2. Gosto muito desse livro; é um clássico a ser lido em qualquer idade.

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