terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Objetos da memória

Sempre gostei de colecionar coisas, de guardar objetos, de anotar datas e acontecimentos. Desde um guardanapo de papel, um ingresso de cinema ou de show até uma carta de amigo ou ainda uma lembrancinha de aniversário ou de nascimento, tudo era motivo para eu guardar dentro do meu guarda-roupa ou das gavetas das cômodas. Sei lá, talvez fosse uma maneira de lembrar, de recordar, quem sabe um dia, de mostrar que aquilo foi importante para mim de alguma maneira, de resgatar o passado, de reavivar a memória. Enfim, era algo que fazia parte da minha personalidade, da minha maneira de ser e de pensar.

No entanto, confesso que joguei muitas coisas fora, infelizmente, que hoje lamento. É que de tanto guardar, os espaços foram ficando pequenos, apertados e até mesmo bagunçados, por isso tive de fazer uma limpeza geral, sem falar nas constantes mudanças e na necessidade de eliminar o que não era primordial. Isso me faz lembrar daquele tão famoso housekeeping (sistema originário do Japão, que visa a prática de bons hábitos dentro de uma empresa) centrado no lema organização, limpeza e disciplina.

Ainda assim, sempre tive uma certa resistência de me desfazer das coisas, porque afinal tudo é importante para mim e tem valor emocional e afetivo. Cartas de amigos, por exemplo, eram o meu maior xodó, isso porque quando tive de mudar na minha adolescência de São Paulo para Indaiatuba, deixei muitos amigos na capital paulista, com os quais me correspondia quase que semanalmente, por três anos seguidos. Porém, como demorei a me adaptar à nova cidade e à moradia, por sentir muita falta dos amigos e de São Paulo, um dia minha irmã chegou para mim e falou:

– Deixa disso, você só vive do passado. Esquece essas cartas.

E o que fiz então? Joguei tudo fora, como se dessa forma pudesse também me livrar daquilo que me prendia a uma outra vida e, assim, poder seguir em frente, acreditava eu. Só que jogando as cartas, joguei também uma parte da minha história, da história dos meus amigos e da história de uma época. Que pena!

Sábado, no curso de JL pude perceber isso com maior clareza, embora já há um bom tempo tivesse essa certeza dentro de mim. A aula foi sobre Biografias e um dos pontos-chaves para se escrever uma história, resgatando a memória, é por meio de objetos, cartas, fotografias, coisas que remetam ao passado da pessoa que se quer biografar. Para ilustrar isso, assistimos ao filme Uma vida iluminada, dirigido por Liev Schreiber, que foi baseado no livro Tudo se Ilumina, do escritor norte-americano Jonathan Safran Foer.

A história gira em torno de um rapaz americano, interpretado no filme por Elijah Wood (o Frodo, de O Senhor dos Aneis), que tem a mania de colecionar objetos. A parede do seu quarto (ou seria uma sala só para isso?), por exemplo, é forrada de coisas como fotografias, pedras, areias, insetos mortos, enfim, de inúmeros outros objetos, cada qual acondicionado dentro de sacos plásticos, com a data e o local do acontecimento.

Muito doente, sua avó lhe dá uma fotografia onde se encontram seu avô, quando jovem, ao lado de uma mulher de nome Augustine, que teria salvado sua vida na época do nazismo. Reparando melhor na foto ele observa que a jovem usa um colar de âmbar e reconhece o objeto no meio de sua coleção. Com a foto e o colar, ele empreende uma viagem até a Ucrânia para encontrar a mulher e é ajudado pelos moradores locais Alex, um jovem que serve de tradutor, mas totalmente atrapalhado com a língua inglesa, seu avô rabugento, assombrado pelas lembranças de guerra, e uma cadela vira-lata chamada Sammy Davis Jr. Jr., uma graça. Juntos, eles partem em busca do lugar retratado na foto e da mulher, e descobrem um país devastado, misturando sentimentos como paixão, medo e culpa.

A história, na verdade, pretende reconstituir o passado, procurando pessoas e lugares que não existem mais e mostra a necessidade de entender o presente à luz do passado. É um filme de poucas falas, com uma bela trilha sonora, estranho, delicado e comovente na medida certa.

Quanto à minha mania de colecionar? Bom, como disse, joguei muitas coisas fora, mas algumas eu guardei e não pretendo me desfazer delas. E, além do mais, é sempre tempo de recomeçar a coleção, agora mais motivada do que nunca.

4 comentários:

  1. Cecilia
    Quando me mudei de um apartamento para uma casa, há uns 6 anos atrás, fiz a besteira de fazer a mesma coisa que você e joguei anos de cartas e lembranças de amigas muito queridas. Nem preciso dizer que me arrependi, né? Agora, estou precisando organizar várias gavetas,cheias de recordações..só os desenhos da minha filha já encheriam uma caixa..mas não tenho mais coragem de jogar nada...
    E esse filme..amo de paixão! Já assisti milhões de vezes e sou louca para ler o livro; o escritor é muito bom, já li outro livro dele e gostei (Extremanente alto & Incrivelmente perto). Bjs

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  2. Tenho vontade de ser uma mosca nessas suas aulas de JL... Sério... Parecem ser perfeitas, ainda mais descritas tão bem por você... E eu também tenho essa mania de guardar coisas e, como você e, acredito, muita gente, já me desfiz de muitas delas... Dá uma dor no peito, né? ai, ai... Beijos, Ciça!

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  3. Recordações são preciosidades!!! Eu amo!!! Principalmente cartas e fotos!

    beijinhos

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  4. cicinha, eu vivo jogando coisas fora, me sinto renovada, guardo as memorias no coraçao, mas seu ponto de vista tambem é valido!
    beijos, saudades!
    Cris

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