Já comentei aqui que o meu local de leitura é o metrô, seja nos vagões do trem, seja nas escadarias das plataformas. Mas há dias em que não me sinto disposta a ler, por mais que eu tente. São dias em que quero apenas sentar (se estiver com sorte), relaxar e esperar pacientemente que a viagem não demore muito. E foi isso o que aconteceu comigo um tempo atrás.
Entrei na estação Santa Cruz do metrô, passei pelas catracas, desci as escadas e fiquei na plataforma esperando o trem chegar. Estava com um pouquinho de dor de cabeça, por isso não me senti tentada a ler, só queria relaxar e ir embora para casa. Para minha felicidade, logo encontrei um lugar para sentar, onde me acomodei e ensaiei fechar os olhos para melhor descansar. Só queria chegar na Sé, para então pegar a outra linha do metrô.
Só que, por um desses acasos que a gente não sabe bem porque acontecem, mas que são muito bem-vindos, algumas pessoas que estavam ao meu redor acabaram me chamando a atenção durante a viagem, e isto por uma única e exclusiva razão: todas estavam lendo. Então passei a observá-las, “camufladamente”, como aprendi nas aulas de Jornalismo Literário.
Ao meu lado, sentada no mesmo banco, havia uma moça que aparentava ter 24 anos. Os olhos eram da cor do mel, como pude notar pelo canto do meu quando ela erguia o rosto do livro; os cabelos curtos e lisos eram castanhos e ela usava uma blusa creme de manga comprida, calça jeans e tênis branco com pequenos detalhes rosas. Completando o visual, brincos que pendiam das orelhas e brilhavam, e uma mochila preta. Nas mãos, ela tinha o volume único de As Crônicas de Nárnia, que traz todos os capítulos da saga de C. S. Lewis. Por vezes ela parava a leitura, mas deu para perceber que chegava ao final do primeiro capítulo; o seguinte seria O Leão, a Feiticeira e o Guarda-Roupa.
Quando o metrô chegou na estação Vila Mariana, outras pessoas entraram, sendo que três delas se acomodaram perto de onde eu estava. Uma ficou em pé bem a minha frente, era uma moça com pouco mais de 28 anos, tinha os cabelos curtos ondulados, cuja cor lembrava um tijolo. Ela usava um óculos rosa fashion, blusa xadrez verde e branco, calça jeans e sapato de plástico verde. Os ombros sustentavam duas bolsas e um casaco verde. Logo ficou absorta na leitura de uma apostila, porque quase não ergueu a cabeça do texto, por isso fiquei curiosa para saber do que se tratava, mas de onde estava não era possível identificar.
Ao lado dessa moça, mas à minha direita, um rapaz de prováveis 36 anos, olhos e cabelos pretos, vestia camisa azul semelhante àquelas usadas por motoristas de ônibus, e calça jeans. Nos pés, um par de tênis preto; às costas, uma mochila preta; e na mão esquerda, uma aliança de ouro. Ele se entretinha com O Guia dos Curiosos, de Marcelo Duarte.
A quarta pessoa ficou em pé ao lado das outras por pouco tempo, conseguindo sentar-se no banco ao lado daquele em que eu estava. Aparentava 22 anos, tinha os cabelos curtos, loiros, e usava uma blusa listrada em tons lilás/branco, calça jeans desbotada e tênis lilás. Ela carregava uma mochila rosa, com detalhes em preto, e no pescoço tinha uma gargantilha em formato de coração, que lhe dava um ar ainda mais jovial. Ela estava com um fone de ouvido e com o livro Harry Potter e a Pedra Filosofal, de J. K. Rowling, aberto em suas mãos.
A viagem foi uma sucessão de olhares, que eu disfarçava, para observar a leitura e o jeito de cada um, tentando gravar na mente as impressões que obtinha deles.
Quando o trem chegou na Sé, tive de descer. Que pena! As minhas observações precisaram ser interrompidas, assim como as leituras para três daqueles leitores. "Sorte da moça loira, que pode ter o privilégio de prosseguir na viagem e na aventura de Harry Potter" – pensei comigo. Mas suspirei aliviada, pois notei que para mim a aventura também ainda não havia chegado ao fim: Logo à minha frente, esperando a vez na escada rolante, estava a moça ruiva, com aquela misteriosa apostila e de onde pude ler o que continha: Subdiagnóstico de delirium no Hospital Geral. Que decepção, nada atrativo, mas pelo menos matei minha curiosidade.
Finda aquela “viagem” e prestes a iniciar outra, resolvi antes fazer uma pausa para um breve registro. Sentei-me nas escadas, peguei papel e caneta e antes que a memória pudesse me trair, escrevi rapidamente o que eu tinha visto, para narrar com mais precisão uma outra hora.
É, os livros me perseguem mesmo, estão sempre comigo, à minha frente, ao meu redor. Se não os estou lendo, ao menos me divirto observando aqueles que o fazem.
Ah, quanto a dor de cabeça, bom... sabe que eu nem me lembrava mais dela.
Huauahuaahuahuahua
ResponderExcluirMuito legal o seu post! Me identifiquei demais com ele, por também usar o metrô para ler, ler e ler. At´w fiquei me procurando aí no etxto, vai que vc me viu, anotou o que eu estava lendo e eu nem percebi! mas, infelizmente, não foi dessa vez. Beijinhos!
ah.. mal sabia essas pessoas que estariam aqui,descritas por você com tanto capricho!quem sabe um dia nós também já não viramos personagens de outros olhares? quando vejo alguém lendo um livro no metrô lembro de vc e a imagino escrevendo,escrevendo...
ResponderExcluirQue saudades de ler no metro e no comboio... era a altura perfeita para me perder na viagem que é ler um (bom) livro.
ResponderExcluirMuito bom esse post!!
Visita-me: http://favouritereadings.blogspot.com
Nossa!!! Que lindo isso! Sério, parece que eu vi...
ResponderExcluirEu tenho certa tara por isso, sabe, de observar coisas e pessoas e momentos e tudo. E, de fato, isso faz passar o tempo, mau humor, dor de cabeça... Tudo...
É delicioso!
Só os adeptos entendem!
Amei o texto!