sexta-feira, 6 de novembro de 2009

Pensando em metáforas













Adoro metáforas, elas dão ritmo ao texto e fazem a imaginação voar. Por isso, fico fascinada quando leio algo que está repleto delas, mas confesso, encabulada, que tenho um pouco de dificuldade em utilizar esse recurso literário nos meus próprios textos. Fazer o quê?

É tudo uma questão de exercício – diz Rita, uma colega do curso de JL.
– Como assim?
– Você tem de praticar. Faça associações de palavras.
– Associações?
– Sim. Comece com nomes de animais. E coloque ao lado o que cada um sugere em termos de imagens e sentimentos.
– Explique melhor.
– Por exemplo, leão, você pode associar com raiva, força; macaco com graça; e assim por diante... Entendeu?
– Ah, acho que sim.
– Então, vá praticando e depois mude para outros tipos de palavras, assim você vai criando um repertório para construir suas metáforas.
– É, gostei. Vou tentar.

Falando assim até que ficou mais fácil, mas Rita tem razão, é tudo uma questão de prática, de exercício, e também de leituras, de muitas leituras de textos ricos nessa figura de linguagem.
Isso me faz lembrar de Pablo Neruda, o poeta chileno que soube utilizar como ninguém as metáforas. Este era um campo que ele dominava com propriedade. Quem assistiu ao O Carteiro e o Poeta, ou leu o livro de Antonio Skármeta, "Ardente Paciencia (el cartero de Neruda)”, que lançado em português ganhou o mesmo nome do filme, teve uma boa mostra dessa habilidade de Neruda.

Eu assisti ao filme e li o livro, mas posso dizer que está aí um dos poucos casos em que a película é melhor do que a obra literária. E não foi porque assisti ao filme primeiro e só depois li o livro, mas é porque a história no cinema ganhou uma outra dimensão, sem falar nas estupendas atuações dos atores Philippe Noiret (Pablo Neruda) e Massimo Troisi (Mário, o carteiro), que faleceu com pouco mais de 40 anos, de um ataque cardíaco, logo após as filmagens.

A história se passa em uma ilha na Itália, para onde Neruda se exilou por razões políticas. Lá ele conhece Mário, um jovem semianalfabeto, que trabalha como carteiro encarregado de cuidar da correspondência do poeta. Desse contato surge uma grande amizade, em que Neruda ajuda Mário a conquistar a bela Beatrice Russo, no filme interpretada pela atriz Maria Grazia Cucinotta, e, é claro, o descobrimento das metáforas e a compreensão delas por parte do carteiro, contribuem eficazmente para isso.

Uma das passagens mais belas é quando Mário lê para Beatrice o poema Nua, escrito por Neruda. Ali, as metáforas explodem em toda a sua graça.


Nua és tão simples como uma de tuas mãos,
lisa, terrestre, mínima, redonda, transparente,
tens linhas de lua, caminhos de maçã,
nua és magra como o trigo nu.
Nua és azul como a noite em Cuba,
tens trepadeiras e estrelas no pêlo,
nua és enorme e amarela
como o verão numa igreja de ouro.
Nua és pequena como uma de tuas unhas,
curva, sutil, rosada até que nasça o dia
e te metes no subterrâneo do mundo
como num longo túnel de trajes e trabalhos:
tua claridade se apaga, se veste, se desfolha
e outra vez volta a ser uma mão nua.

Bom, depois deste poema de Neruda, acho que não é preciso dizer mais nada sobre metáforas. É só colocar no papel e se exercitar.

3 comentários:

  1. mto legal...vc sempre escolhe temas interessantes para divagar.
    Não é fácil fazer metáforas, mas é isso mesmo...com treino as coisas começam a fluir...e o texto fica instigante né!

    bjao

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  2. Taí um filme que quero MUITO ver. Aliás, não sei porque ainda não tomei vergonha na cara e não vi. Sou, como você, uma admiradora de metáforas também...
    Desculpe-me pelo tempo que fiquei sem dar as caras... Mas, como sempre, fico longe e, quando volto, deparo-me com coisas lindas, lindas, lindas...
    Beijos, Ciça!

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