“... enquanto aprontavam o baú de José Arcádio, Úrsula se perguntava se não era preferível se deitar logo de uma vez na sepultura e lhe jogarem a terra por cima, e perguntava a Deus, sem medo, se realmente acreditava que as pessoas eram feitas de ferro para suportar tantas penas e mortificações; e perguntando e perguntando ia atiçando a sua própria perturbação e sentia desejos irreprimíveis de se soltar e não ter papas na língua como um forasteiro e de se permitir afinal um instante de rebeldia, o instante tantas vezes desejado e tantas vezes adiado, para cortar a resignação pela raiz e cagar de uma vez para tudo e tirar do coração os infinitos montes de palavrões que tivera que engolir durante um século inteiro de conformismo.
– Porra! – gritou.
Amaranta, que começava a colocar a roupa no baú, pensou que ela tinha sido picada por um escorpião.
– Onde está? – perguntou alarmada.
– O quê?
– O animal! – esclareceu Amaranta.
Úrsula pôs o dedo no coração.
– Aqui – disse.”
Em Cem Anos de Solidão, a personagem Úrsula permite-se soltar um palavrão, depois de tantos anos se reprimindo. Ao ler essa passagem, lembrei-me de um texto que escrevi recentemente durante as aulas de Fundamentos Narrativos, no curso de Jornalismo Literário que faço. Na aula, o professor pediu para descrever o temperamento de uma pessoa que conhecêssemos bem e eu logo pensei em uma colega do trabalho, que tem um comportamento explosivo, com muitas facetas a serem exploradas, mas que no fundo tem um coração de ouro.
Escrevi um texto curto, sem pensar muito, com aquilo que vinha na mente, ficou até engraçado e o pessoal da classe gostou. Fiquei satisfeita na hora, porque dificilmente escrevo com humor, por isso admiro quem o faça.
O professor, contudo, disse para focar em apenas uma característica mais forte e colocar falas, com as frases proferidas pela personagem. Então refiz o texto. E agora, lembrando da cena de Úrsula, sinto que pela voz da minha personagem eu também cometi meu ato de rebeldia e coloquei para fora as palavras que estavam guardadas por tanto tempo dentro de mim.
– Porra! – gritou.
Amaranta, que começava a colocar a roupa no baú, pensou que ela tinha sido picada por um escorpião.
– Onde está? – perguntou alarmada.
– O quê?
– O animal! – esclareceu Amaranta.
Úrsula pôs o dedo no coração.
– Aqui – disse.”
Em Cem Anos de Solidão, a personagem Úrsula permite-se soltar um palavrão, depois de tantos anos se reprimindo. Ao ler essa passagem, lembrei-me de um texto que escrevi recentemente durante as aulas de Fundamentos Narrativos, no curso de Jornalismo Literário que faço. Na aula, o professor pediu para descrever o temperamento de uma pessoa que conhecêssemos bem e eu logo pensei em uma colega do trabalho, que tem um comportamento explosivo, com muitas facetas a serem exploradas, mas que no fundo tem um coração de ouro.
Escrevi um texto curto, sem pensar muito, com aquilo que vinha na mente, ficou até engraçado e o pessoal da classe gostou. Fiquei satisfeita na hora, porque dificilmente escrevo com humor, por isso admiro quem o faça.
O professor, contudo, disse para focar em apenas uma característica mais forte e colocar falas, com as frases proferidas pela personagem. Então refiz o texto. E agora, lembrando da cena de Úrsula, sinto que pela voz da minha personagem eu também cometi meu ato de rebeldia e coloquei para fora as palavras que estavam guardadas por tanto tempo dentro de mim.
Escrever, é também falar. E “falar palavrão é coisa séria”, disse certa vez o poeta José Paulo Paes (1926 – 1998).
O resultado do texto você confere aqui.
Ela chega de repente na sala e rasga o verbo:
– Puta que o pariu!
Resmunga um pouco, mas depois começa a trabalhar.
Do outro lado da sala, os companheiros de trabalho aproveitam a deixa e começam a fazer piadinhas para provocá-la ainda mais. Um deles chega até a imitá-la e, fazendo-se de seu eco, acrescenta:
– Puta que o pariu, seu lazarento.
Ela não deixa por menos, corresponde “gentilmente” na mesma moeda e retruca:
– Eu quero que todos vocês se fodam!
O dia não podia começar com melhor astral. Todos riem porque é mais uma brincadeira com minha colega jornalista, que divide comigo as mazelas do trabalho na agência de comunicação.
Ela não tem papas na língua, fala o que lhe vier “na telha”, como costuma-se dizer. De dez palavras pronunciadas, oito pelo menos são palavrões.
Seguindo sua rotina diária, ela passa o dia xingando o chefe, de tudo quanto é nome e jeito, principalmente quando ele cobra por uma frase mal colocada ou um erro ortográfico nos textos publicados.
– O que ele está precisando é de uma puta daquelas.
Depois, faz-se de vítima, culpa também os outros, diz que vai pedir demissão, que não aguenta mais ser injustiçada e que está cansada daquele trabalho.
– Caralho, chega de humilhação.
É mais um drama passional.
Daqui a pouco ela alterna o seu temperamento explosivo e desbocado por um mais brando e submisso, senta-se calmamente na sua cadeira, relembra os anos que está ali trabalhando, diz que não consegue viver sem a agência e termina reafirmando seu afeto pelo chefe.
– Vai fazer o quê? Eu gosto de merda mesmo.
O resultado do texto você confere aqui.
Ela chega de repente na sala e rasga o verbo:
– Puta que o pariu!
Resmunga um pouco, mas depois começa a trabalhar.
Do outro lado da sala, os companheiros de trabalho aproveitam a deixa e começam a fazer piadinhas para provocá-la ainda mais. Um deles chega até a imitá-la e, fazendo-se de seu eco, acrescenta:
– Puta que o pariu, seu lazarento.
Ela não deixa por menos, corresponde “gentilmente” na mesma moeda e retruca:
– Eu quero que todos vocês se fodam!
O dia não podia começar com melhor astral. Todos riem porque é mais uma brincadeira com minha colega jornalista, que divide comigo as mazelas do trabalho na agência de comunicação.
Ela não tem papas na língua, fala o que lhe vier “na telha”, como costuma-se dizer. De dez palavras pronunciadas, oito pelo menos são palavrões.
Seguindo sua rotina diária, ela passa o dia xingando o chefe, de tudo quanto é nome e jeito, principalmente quando ele cobra por uma frase mal colocada ou um erro ortográfico nos textos publicados.
– O que ele está precisando é de uma puta daquelas.
Depois, faz-se de vítima, culpa também os outros, diz que vai pedir demissão, que não aguenta mais ser injustiçada e que está cansada daquele trabalho.
– Caralho, chega de humilhação.
É mais um drama passional.
Daqui a pouco ela alterna o seu temperamento explosivo e desbocado por um mais brando e submisso, senta-se calmamente na sua cadeira, relembra os anos que está ali trabalhando, diz que não consegue viver sem a agência e termina reafirmando seu afeto pelo chefe.
– Vai fazer o quê? Eu gosto de merda mesmo.
Opa! Jornalista? Eu também!
ResponderExcluirAdorei sua visita! Vou te linkar no meu cantinho, assim passarei aqui everyday!
beijokas!
Dias atrás eu enquanto escovava os dentes, porta fechada, do outro lado a Aninha falava devagarinho, salientando cada sílaba: mas...que...mer..da. Assim fez três ou quatro vezes. Nada falei, busquei na memória se ela ouviu de mim estas palavras e vi que sim. Mas que merda!
ResponderExcluirEm um livro, o palavrão acorda a leitura, dá agilidade, imprime força, chega a nos fazer rir pela quebra de protoculo.
Mas pelo menos nos livros os filhos mais novos não ouvem. Vou me policiar mais.